— CAPÍTULO TRINTA E TRÊS —
Os Comensais da Morte
VOLDEMORT DESVIOU O OLHAR
DE HARRY e começou a examinar o próprio corpo. Suas mãos eram como aranhas
grandes e pálidas, seus longos dedos brancos acariciaram o próprio peito, os
braços, o rosto, os olhos vermelhos, cujas pupilas eram fendas, como as de um
gato, brilhavam ainda mais no escuro. Ele ergueu as mãos e flexionou os dedos
com uma expressão arrebatada e exultante. Não deu a menor atenção a Rabicho,
que continuou tremendo e sangrando no chão, nem à enorme cobra, que reapareceu
em cena e recomeçou a descrever círculos em torno de Harry, sibilando.
Voldemort
enfiou um dos dedos anormalmente longos em um bolso fundo e tirou uma varinha.
Acariciou-a gentilmente também, depois ergueu-a e apontou-a para Rabicho, e ela
o guindou do chão e atirou contra a lápide a que Harry estava amarrado, o bruxo
caiu aos pés da lápide e ficou ali, encolhido, chorando.
Voldemort
voltou seus olhos vermelhos para Harry e soltou uma risada, aquela sua risada
aguda, fria e sem alegria. As vestes de Rabicho agora estavam manchadas de
sangue brilhante, o bruxo enrolara nelas o toco de braço.
—
Milorde... — disse ele com a voz embargada — Milorde... o senhor prometeu... o
senhor prometeu...
—
Estique o braço — disse Voldemort indolentemente.
— Ah,
meu amo... obrigado, meu amo...
Rabicho
esticou o toco sangrento, mas Voldemort deu uma gargalhada.
— O
outro braço, Rabicho.
— Meu
amo, por favor... por favor...
Voldemort
se curvou e puxou o braço esquerdo de Rabicho, empurrou a manga das vestes do
servo acima do cotovelo e Harry viu que havia uma coisa na pele, uma coisa que
lembrava uma tatuagem vermelho-vivo, um crânio, com uma cobra saindo da boca, a
mesma imagem que aparecera no céu na Copa Mundial de Quadribol: a Marca Negra.
Voldemort examinou-a demoradamente, sem dar atenção ao choro descontrolado de
Rabicho.
—
Reapareceu — comentou ele baixinho — Todos deverão ter notado... e agora,
veremos... agora saberemos...
Ele
comprimiu a marca no braço do servo com seu longo indicador branco.
A
cicatriz na testa de Harry ardeu com uma dor aguda e Rabicho deixou escapar um
uivo. Voldemort afastou o dedo da marca em Rabicho e Harry viu que ela se
tornara muito preta. Com uma expressão de cruel satisfação no rosto, Voldemort
se endireitou, atirou a cabeça para trás e começou a examinar o escuro
cemitério.
—
Quantos terão suficiente coragem para
voltar quando sentirem isso? — sussurrou ele, fixando seus olhos vermelhos e
brilhantes nas estrelas — E quantos serão bastante tolos para ficar longe de
mim?
Ele
começou a andar de um lado para outro diante de Harry e Rabicho, seus olhos
percorrendo o cemitério todo o tempo. Decorrido pouco mais de um minuto, ele
tornou a olhar para Harry, um sorriso cruel deformando seu rosto viperino.
—
Você está em pé, Harry Potter, sobre os restos mortais do meu pai — sibilou ele
baixinho — Um trouxa e um idiota... muito parecido com a sua querida mãe. Mas
os dois tiveram sua utilidade, não? Sua mãe morreu tentando defendê-lo quando
criança... e eu matei meu pai e veja como ele se provou útil, depois de
morto...
Voldemort
soltou outra gargalhada. Para cima e para baixo ele andava, olhando para os
lados, e a serpente continuava a circular no meio do capim.
—
Você está vendo aquela casa lá na encosta do morro, Potter? Meu pai morava ali.
Minha mãe, uma bruxa que vivia no povoado, se apaixonou por ele. Mas foi
abandonada quando lhe contou o que era... ele não gostava de magia, meu pai...
ele a abandonou e voltou para os pais trouxas antes de eu nascer, Potter, e ela
morreu me dando à luz, me deixando para ser criado em um orfanato de trouxas...
mas eu jurei encontrá-lo... vinguei-me dele, desse idiota que me deu seu
nome... Tom Riddle...
E
andava sem parar, seus olhos correndo de um túmulo para outro.
— Me
vejam só recordando minha história de família... — comentou ele baixinho — Ora,
ora, estou ficando muito sentimental... mas veja Harry! A minha família
verdadeira está chegando...
O ar
se encheu repentinamente com o rumor de capas esvoaçantes. Entre os túmulos,
atrás do teixo, em cada espaço escuro, havia bruxos aparatando... todos usavam
capuzes e máscaras. E um por um, eles se adiantaram... lentamente,
cautelosamente, como se mal conseguissem acreditar no que viam.
Voldemort
ficou parado em silêncio, esperando-os. Então um Comensal da Morte se prostrou
de joelhos, arrastou-se até Voldemort, e beijou a barra de suas vestes negras.
— Meu
amo... meu amo...
Os
Comensais da Morte que vinham atrás o imitaram, um por um, eles se aproximaram
de joelhos para beijar as vestes de Voldemort para depois recuar e se levantar,
formando um círculo silencioso em torno do túmulo de Tom Riddle, Harry,
Voldemort e o monte de vestes que soluçava e sacudia, que era Rabicho. Mas eles
deixaram espaços vazios no círculo, como se esperassem mais gente.
Voldemort,
porém, não parecia esperar mais ninguém. Olhou os rostos encapuzados ao seu
redor e, embora não houvesse vento, um rumorejo pareceu percorrer o círculo
como se perpassasse por ele um arrepio.
— Bem
vindos, Comensais da Morte — disse Voldemort em voz baixa — Treze anos... treze
anos desde que nos encontramos pela última vez. Contudo, vocês atendem ao meu
chamado como se fosse ontem... então continuamos unidos sob a Marca Negra! Ou
será que não?
Ele
retomou sua expressão ameaçadora e farejou, dilatando as narinas em forma de
fenda.
—
Sinto cheiro de culpa — disse ele — Há um fedor de culpa no ar.
Um
segundo surto de arrepios percorreu o círculo, como se cada membro tivesse o
desejo, mas não a coragem, de se afastar dali.
—
Vejo todos vocês, inteiros e saudáveis, com os seus poderes intactos, tão
desenvoltos! E me pergunto... por que esse bando de bruxos nunca foi socorrer
seu amo, a quem jurou lealdade eterna?
Ninguém
falou. Ninguém se mexeu exceto Rabicho, que continuava no chão, chorando, o braço
ensangüentado.
— E
eu próprio respondo — sussurrou Voldemort — Porque devem ter acreditado que eu
estava derrotado, pensaram que eu acabara. Voltaram a se misturar com os meus
inimigos e alegaram inocência, ignorância e bruxaria... e então eu me pergunto,
mas como é que vocês podem ter acreditado que eu não me reergueria? Vocês, que
conheciam as providências que eu tomara, há muito tempo, para me proteger da
morte humana? Vocês que tiveram provas da imensidão do meu poder, na época em
que fui mais poderoso do que qualquer bruxo vivente? E eu mesmo respondo,
talvez acreditassem que poderia haver um poder ainda maior, um poder capaz de
derrotar até Lorde Voldemort... talvez vocês agora prestem lealdade a outro...
talvez àquele campeão da plebe, dos trouxas e sangue ruins, Alvo Dumbledore?
À
menção do nome de Dumbledore, os membros do circulo se inquietaram, alguns
murmuraram e negaram sacudindo a cabeça.
Voldemort
ignorou-os.
— Um
desapontamento para mim... confesso que estou desapontado...
Um
dos bruxos se atirou subitamente à frente, rompendo o círculo. Tremendo da
cabeça aos pés, prostrou-se aos pés de Voldemort.
— Meu
amo! — exclamou — Meu amo, me perdoe! Nos perdoe todos!
Voldemort
começou a rir. Ergueu a varinha.
— Crucio!
O
Comensal da Morte no chão contorceu-se e gritou, Harry teve certeza de que o
som se propagava até as casas vizinhas... Tomara que a polícia chegue, desejou
ele desesperado... Alguém... alguma coisa...
Voldemort
ergueu a varinha. O Comensal da Morte torturado se estatelou no chão, arfando.
—
Levante-se, Avery — disse Voldemort baixinho — Ponha-se de pé. Você está me
pedindo perdão? Eu não perdôo. Eu não esqueço. Treze longos anos... quero um
pagamento por esses treze anos antes de perdoar-lhes. Rabicho aqui já pagou
parte da dívida, não foi, Rabicho?
Ele
baixou os olhos para o bruxo mutilado, que continuava a soluçar.
—
Você voltou para mim, não por lealdade, mas por medo dos seus antigos amigos.
Você merece sentir dor, Rabicho. Você sabe disso, não sabe?
—
Sei, meu amo — gemeu Rabicho — Por favor, meu amo... por favor...
—
Contudo você me ajudou a recuperar meu corpo — disse Voldemort friamente,
observando o servo soluçar no chão — Mesmo inútil e traiçoeiro como é, você me
ajudou... e Lorde Voldemort recompensa quem o ajuda...
Voldemort
tornou a erguer a varinha e girou-a no ar. Um fio que parecia feito de prata
liquefeita prolongou-se da varinha e pairou no ar. Momentaneamente informe, o
fio se agitou e em seguida se transformou na réplica brilhante de uma mão
humana, clara como o luar, que saiu voando e foi se prender ao pulso sangrento
de Rabicho.
Os
soluços do bruxo pararam abruptamente. Com a respiração rascante e falha, ele
levantou a cabeça e fitou, incrédulo, a mão prateada, agora ligada sem costura
ao seu braço, como se ele estivesse usando uma luva luminosa. O bruxo flexionou
os dedos reluzentes, depois, trêmulo, apanhou um graveto no chão e
pulverizou-o.
—
Milorde — sussurrou ele — Meu amo... é linda... muito obrigado... muito
obrigado...
Ele
avançou de joelhos e beijou a barra das vestes de Voldemort.
— Que
a sua lealdade jamais volte a vacilar, Rabicho — disse Voldemort.
—
Não, milorde... nunca, milorde...
Rabicho
se levantou e tomou posição no círculo, sem tirar os olhos da mão nova e
poderosa, seu rosto lavado de lágrimas.
Voldemort
se aproximou então do homem à direita de Rabicho.
—
Lúcio, meu ardiloso amigo — murmurou ele se detendo diante do bruxo — Ouço
dizer que você não renunciou aos seus hábitos antigos, embora para o mundo você
apresente uma imagem respeitável. Acredito que continue pronto para assumir a
liderança de uma torturazinha de trouxas? No entanto você nunca tentou me
encontrar, Lúcio... as suas aventuras na Copa Mundial de Quadribol foram
engraçadas, devo dizer... mas será que suas energias não teriam sido melhor
empregadas em procurar ajudar seu amo?
—
Milorde, sempre estive constantemente alerta — ouviu-se na mesma hora a voz de
Lúcio Malfoy saindo por baixo do capuz — Se tivesse havido algum sinal do
senhor, algum rumor sobre seu paradeiro, eu teria ido imediatamente para o seu
lado, nada teria me detido...
—
Contudo, você correu da minha marca, quando um leal Comensal da Morte a
projetou no céu no verão passado — comentou displicentemente Voldemort, e o Sr.
Malfoy parou abruptamente de falar — É, sei de tudo que aconteceu, Lúcio...
você me desapontou... espero serviços mais leais no futuro.
—
Naturalmente, milorde, naturalmente... o senhor é misericordioso, obrigado...
Voldemort
continuou a andar e parou, reparando no espaço, suficientemente grande para
duas pessoas, que separava Malfoy do comensal seguinte.
— Os
Lestrange deveriam estar aqui — disse Voldemort baixinho — Mas estão enterrados
vivos em Azkaban. Foram fiéis. Preferiram ir para Azkaban a renunciar a mim...
quando Azkaban for aberta, os Lestrange receberão honras que ultrapassarão
todos os seus sonhos. Os dementadores se unirão a nós... são nossos aliados
naturais... chamaremos de volta os gigantes banidos... todos os meus servos
devotados me serão devolvidos e um exército de criaturas que todos temem...
Ele
continuou sua caminhada. Passou por alguns comensais em silêncio, mas parou
diante de outros para lhes falar.
—
Macnair... eliminando animais perigosos para o Ministério da Magia agora,
segundo me conta Rabicho. Breve você terá melhores vítimas, Macnair. Lorde
Voldemort irá providenciá-las...
—
Obrigado, meu amo... obrigado — murmurou Macnair.
— E
aqui — Voldemort prosseguiu dirigindo-se aos dois maiores vultos encapuzados —
Temos Crabbe... você vai trabalhar melhor desta vez, não vai, Crabbe? E você,
Goyle?
Os
dois fizeram uma reverência desajeitada, murmurando com uma certa lentidão:
—
Sim, meu amo...
—
Trabalharemos, meu amo...
— O
mesmo se aplica a você, Nott — disse Voldemort baixinho, ao passar pelo vulto
curvado à sombra do Sr. Goyle.
— Milorde,
eu me prostrei diante do senhor, sou o seu mais fiel...
—
Basta — disse Voldemort.
Ele
chegou, então, à maior lacuna no círculo, e parou contemplando-a com seus olhos
parados e vermelhos, como se pudesse ver pessoas em pé ali.
— E
aqui temos seis Comensais da Morte ausentes... três mortos a meu serviço. Um
demasiado covarde para voltar... ele me pagará. Um que eu acredito ter me
deixado para sempre... este será morto, é claro... e um que continua sendo meu
mais fiel servo, e que já reingressou no meu serviço.
Os
Comensais da Morte se agitaram, Harry viu que eles se entreolhavam por trás das
máscaras.
— Ele
está em Hogwarts, esse servo fiel, e foi graças aos seus esforços que o nosso
jovem amigo chegou aqui esta noite... sim — disse Voldemort, um sorriso
crispando sua boca sem lábios, quando os olhares do círculo convergiram para
Harry — Harry Potter teve a gentileza de se reunir a nós para comemorar a minha
ressurreição. Poderíamos até chamá-lo de meu convidado de honra.
Fez-se
silêncio. Em seguida o Comensal da Morte à direita de Rabicho deu um passo à
frente, e a voz de Lúcio Malfoy falou por baixo da máscara.
— Meu
amo, é grande o nosso desejo de saber... suplicamos que nos conte... como foi
que o senhor conseguiu este... milagre... como conseguiu voltar para nós...
— Ah,
que história extraordinária, Lúcio! — disse Voldemort — E ela começa... e
termina... com o meu jovem amigo aqui.
Ele
caminhou descansadamente e parou ao lado de Harry, fazendo com que os olhos de
todo o círculo se voltassem para os dois.
A
cobra continuava a rastejar em círculos.
—
Vocês sabem, naturalmente, que muitos chamam este garoto de minha perdição! —
disse Voldemort baixinho, os olhos fixos em Harry, cuja cicatriz começou a
arder tão ferozmente que ele quase gritou de agonia — Vocês todos sabem que na
noite em que perdi meus poderes e o meu corpo, tentei matá-lo. A mãe dele
morreu, tentando salvá-lo, e, sem saber, o resguardou com uma proteção que,
devo admitir, eu não havia previsto... eu não pude tocar no rapaz.
Voldemort
ergueu um longo dedo branco e levou-o até próximo do rosto de Harry.
— A
mãe deixou nele os vestígios do seu sacrifício... isto é magia antiga, de que
eu devia ter me lembrado, foi uma tolice tê-la esquecido... mas isso não
importa. Eu agora posso tocá-lo.
Harry
sentiu a ponta fria do longo dedo branco tocá-lo, e pensou que sua cabeça ia
explodir de dor. Voldemort riu de mansinho na orelha do garoto, depois afastou
o dedo e continuou a se dirigir aos Comensais da Morte.
— Eu
calculei mal, meus amigos, admito. Minha maldição foi refratada pelo tolo
sacrifício da mulher e ricocheteou contra mim. Ah... a dor que ultrapassa a
dor, meus amigos, nada poderia ter me preparado para aquilo. Fui arrancado do
meu corpo, me tornei menos que um espírito, menos que o fantasma mais
insignificante... mas, ainda assim, continuei vivo. Em que me transformei, nem
eu mesmo sei... eu que cheguei mais longe do que qualquer outro no caminho que
leva à imortalidade. Vocês conhecem o meu objetivo, vencer a morte. E agora fui
testado, e aparentemente uma, ou mais de uma, das minhas experiências foi bem
sucedida... pois eu não morri, embora a maldição devesse ter me matado.
Contudo, fiquei tão impotente quanto a mais fraca criatura viva e sem meios de
ajudar a mim mesmo... pois não possuía mais corpo, e qualquer feitiço que
pudesse ter me ajudado exigia o uso da varinha... só me lembro de me obrigar,
sem dormir, sem cessar, segundo a segundo, a existir... fui morar em um lugar
distante, numa floresta e esperei... certamente um dos meus fiéis Comensais da
Morte tentaria me encontrar... um deles viria e realizaria por mim a mágica
necessária para eu recuperar meu corpo... mas esperei em vão...
O
arrepio tornou a perpassar o círculo de atentos Comensais da Morte.
Voldemort
deixou o silêncio espiralar de modo terrível antes de prosseguir:
— Só
me restara um poder. Eu podia me apossar do corpo de outros. Mas eu não me
atrevia a ir aonde viviam muitos humanos, pois eu sabia que os aurores
continuavam a viajar pelo exterior à minha procura. Por vezes eu habitava
animais, as cobras, é claro, eram minhas preferidas, mas eu não ficava muito
melhor dentro delas do que como puro espírito, porque seus corpos eram mal
equipados para realizar mágicas... e apossar-me delas encurtava suas vidas,
nenhuma delas sobreviveu muito tempo... então... há quatro anos... os meios
para o meu retorno me pareceram garantidos. Um bruxo, jovem, tolo e crédulo,
cruzou o meu caminho na floresta em que eu vivia. Ah, ele parecia exatamente a
chance com que eu sonhara... porque era professor na escola de Dumbledore...
era dócil à minha vontade... e me trouxe de volta a este país e, pouco depois,
me apoderei do seu corpo para vigiá-lo de perto enquanto cumpria minhas ordens.
Mas meu plano fracassou. Não consegui roubar a Pedra Filosofal. Não pude obter
a vida eterna. Fui impedido... fui impedido, mais uma vez, por Harry Potter...
Novamente
o silêncio, nada se movia, nem mesmo as folhas do teixo. Os Comensais da Morte
permaneceram muito quietos, os olhos cintilantes em suas máscaras fixos em
Voldemort e Harry.
— Meu
servo morreu quando abandonei seu corpo, e fiquei mais fraco do que jamais
estive. Voltei ao meu esconderijo distante, e não vou fingir que não receei
então que talvez jamais recuperasse meus poderes... sim, aquela talvez tenha
sido a hora mais negra da minha vida... eu não poderia esperar que caísse do
céu outro bruxo para eu me apoderar... e já perdera as esperanças de que algum
Comensal da Morte se importasse com o que me acontecera...
Uns
dois bruxos mascarados no círculo se mexeram constrangidos, mas Voldemort não
lhes deu a menor atenção.
—
Então, há menos de um ano, quando eu praticamente abandonara toda esperança,
aconteceu... um servo voltou para mim, o Rabicho aqui, que simulara a própria
morte para fugir à justiça, foi forçado a se expor por aqueles que no passado
tinham sido seus amigos, e resolveu voltar para o seu amo. Ele me procurou no
campo onde houvera boatos de que eu estaria escondido... ajudado, naturalmente,
pelos ratos que encontrou em seu caminho. Rabicho tem uma curiosa afinidade por
ratos, não é mesmo, Rabicho? Seus imundos amiguinhos lhe contaram que havia um
lugar, no meio de uma floresta albanesa que eles evitavam, onde pequenos
animais como eles encontravam a morte pelas mãos de um vulto escuro que os
possuía... mas a viagem de regresso não correu tranqüilamente para mim, não é,
Rabicho?
“Certa
noite, esfomeado, na orla da floresta em que esperava me encontrar, ele parou,
tolamente, em uma estalagem para comer alguma coisa... e quem ele haveria de encontrar
lá, se não Berta Jorkins, uma bruxa do Ministério da Magia? Agora vejam como o
destino favorece Lorde Voldemort. Isto poderia ter sido o fim de Rabicho e da
minha última chance de regeneração. Mas Rabicho, revelando uma presença de
espírito que eu jamais esperaria dele, convenceu Berta Jorkins a acompanhá-lo
em um passeio noturno. Ele a dominou... e a trouxe até mim. E Berta Jorkins,
que poderia ter posto tudo a perder, em vez disso provou ser uma dádiva que
superou as minhas expectativas mais extravagantes... pois, com um nadinha de
persuasão, tornou-se uma verdadeira mina de informações. Ela me contou que este
ano seria realizado um Torneio Tribruxo em Hogwarts. E que conhecia um Comensal
da Morte fiel que teria muito prazer em me ajudar, se eu o procurasse. Ela me
contou muitas coisas... mas os meios que usei para romper o Feitiço da Memória
que a dominava foram fortes, e depois que extrai dela toda informação útil, sua
mente e seu corpo ficaram irrecuperavelmente danificados. Servira a sua finalidade.
Mas eu não poderia me apossar do seu corpo. Descartei-a.”
Voldemort
sorriu, aquele sorriso medonho, seus olhos vermelhos vidrados e cruéis.
— O
corpo de Rabicho, naturalmente, era pouco próprio para uma possessão, já que
todos o presumiam morto e ele atrairia demasiada atenção se fosse visto.
Contudo, era o servo fisicamente válido de que eu precisava. E, embora fosse um
bruxo medíocre, foi capaz de seguir as instruções que lhe dei e que me
devolveriam um corpo rudimentar e fraco, porém meu, um corpo que eu poderia
habitar enquanto esperava os ingredientes essenciais para uma verdadeira
ressurreição... uns feitiços de minha própria invenção... uma ajudazinha de
Nagini
Os
olhos de Voldemort se voltaram para a cobra que circulava a lápide sem parar.
— Uma
poção feita com sangue de unicórnio, veneno de cobra fornecido por Nagini... e
logo eu recuperei uma forma quase humana e suficientemente forte para viajar.
Não havia mais esperanças de roubar a Pedra Filosofal, pois eu sabia que
Dumbledore teria tomado providências para destruí-la. Mas eu estava disposto a
abraçar mais uma vez a vida mortal antes de perseguir a imortal. Estabeleci
objetivos mais modestos... aceitei ter o meu antigo corpo e a minha antiga
força de volta. Eu sabia que para obter isso, que é uma velha peça de Magia
Negra a poção que me reanimou hoje à noite, eu precisaria de três poderosos
ingredientes. Bem, um deles já estava à mão, não é mesmo, Rabicho? A carne
doada por um servo... o osso do meu pai, naturalmente, significava que eu teria
que vir até aqui, onde ele estava enterrado. Mas o sangue de um inimigo...
“Rabicho
queria que eu usasse um bruxo qualquer, não foi, Rabicho? Um bruxo qualquer que
tivesse me odiado... como tantos ainda odeiam. Mas eu sabia do que precisava,
se era para me reerguer mais poderoso do que tinha sido antes da queda. Eu
queria o sangue de Harry Potter. Eu queria o sangue daquele que tinha me
despojado do poder há treze anos, porque a proteção duradoura que a mãe dele
tinha lhe dado circularia em minhas veias também... mas como apanhar Harry
Potter? Porque ele foi protegido muito mais do que acho que ele sabe, protegido
de várias maneiras criadas por Dumbledore há muito tempo, quando recebeu o
encargo de cuidar do futuro do garoto. Dumbledore invocou uma mágica antiga
para garantir a proteção ao garoto enquanto estivesse aos cuidados dos
parentes. Nem mesmo eu posso tocá-lo em casa deles... depois, naturalmente
houve a Copa Mundial de Quadribol... achei que a proteção dele enfraqueceria
ali, longe dos parentes e de Dumbledore, mas eu ainda não estava
suficientemente forte para tentar seqüestrá-lo em meio a uma horda de bruxos do
Ministério. Depois, o garoto retornaria a Hogwarts, onde vive debaixo do nariz
torto daquele tolo, amante de trouxas, de manhã à noite.
“Então,
como poderia capturá-lo? Ora... aproveitando as informações de Berta Jorkins, é
claro. Usando o meu fiel Comensal da Morte, baseado em Hogwarts, para garantir
que o nome do garoto fosse inscrito no Cálice de Fogo. Usando o meu Comensal da
Morte para garantir que o garoto ganhasse o torneio, que tocasse a Taça
Tribruxo primeiro, Taça que o meu Comensal da Morte havia transformado em uma
Chave de Portal para trazê-lo aqui, longe do socorro e proteção de Dumbledore,
até o aconchego dos meus braços abertos para recebê-lo. E aqui está ele... o
garoto que vocês todos acreditaram que tinha sido minha ruína...”
Voldemort
avançou lentamente e se virou para encarar Harry. Ergueu a varinha.
— Crucio!
Foi
uma dor que superou qualquer coisa que Harry já sofrera, seus próprios ossos
pareciam estar em fogo, sua cabeça, sem dúvida alguma, estava rachando ao longo
da cicatriz, seus olhos giravam descontrolados em sua cabeça, ele queria que
tudo terminasse... que perdesse os sentidos... morresse...
Então
passou. Ele ficou pendurado nas cordas que o prendiam à lápide do pai de
Voldemort, olhando aqueles brilhantes olhos vermelhos através de uma espécie de
névoa. A noite ressoava com o estrépito das risadas dos Comensais da Morte.
—
Estão vendo a tolice que foi vocês suporem que este garoto algum dia pudesse
ser mais forte que eu? — ponderou Voldemort — Mas eu não quero que reste nenhum
engano na mente de ninguém. Harry Potter me escapou por pura sorte. E vou
provar o meu poder matando-o, aqui e agora, diante de todos vocês, onde não há
Dumbledore para ajudá-lo nem mãe para morrer por ele. Vou dar a Harry uma
oportunidade. Ele poderá lutar, e vocês não terão mais dúvida alguma sobre qual
de nós é mais forte. Espere mais um pouquinho Nagini.
Sussurrou
ele, e a cobra se afastou, deslizando pelo capim, até o local em que os
Comensais da Morte estavam parados observando.
—
Agora, desamarre-o Rabicho, e devolva sua varinha.
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