sábado, 30 de junho de 2012

Sessão Premier: A Madrasta - Capítulo 11



DIM-DOM
SÀO 19:00 HORAS
Chega agora a Sessão Premier:
A Madrasta


Maria foi condenada pelo assassinato de sua amiga Patrícia, apesar de sempre ter se dito inocente. Após Vinte Anos, Maria é libertada e agora ela quer reaver o amor de seus filhos, de quem foi afastada pelo ex-marido Estevão, julgando que a sua ex-esposa fosse mesmo uma assassina. Mas agora ela está de volta, e além de seus filhos, Maria quer encontrar o verdadeiro criminoso e limpar o seu nome. De uma bondosa mulher, Maria torna-se fria e cruel em sua cruzada para ter vingança contra os supostos amigos, amigos esses que são também os principais suspeitos da morte de Patrícia.


APRESENTANDO HOJE:
Capítulo 11 - Estevão e Maria se casam... de novo!






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Harry Potter e o Cálice de Fogo - Capítulo 35






— CAPÍTULO TRINTA E CINCO —
Veritaserum



HARRY SENTIU QUE CAÍA chapado no chão, seu rosto comprimiu a grama, cujo cheiro invadiu suas narinas. Ele fechara os olhos enquanto a Chave do Portal o transportava, e os mantinha fechados até aquele momento. Não se mexeu. Todo o ar parecia ter sido expulso dos seus pulmões, sua cabeça rodava tanto que ele sentia o chão balançar sob seu corpo como se fosse o convés de um navio. Para se firmar, apertou com mais força as duas coisas que continuava a segurar, a asa lisa e fria da Taça Tribruxo e o corpo de Cedrico. Tinha a sensação de que ia deslizar para a escuridão que se formava na periferia do seu cérebro se largasse qualquer das duas.
O choque e a exaustão o mantiveram no chão, inspirando o cheiro de grama, esperando... esperando que alguém fizesse alguma coisa... que alguma coisa acontecesse... e, todo o tempo, sua cicatriz ardia surdamente em sua testa... uma enxurrada de sons o ensurdeceu e confundiu, havia vozes por toda parte, passos, gritos... ele continuou onde estava, o rosto contraído contra o barulho, como se aquilo fosse um pesadelo que ia passar...
Então duas mãos o agarraram com uma certa violência e o viraram de barriga para cima.
— Harry! Harry!
O garoto abriu os olhos. Estava olhando para o céu estrelado e Alvo Dumbledore se debruçava sobre ele. As sombras escuras das pessoas que se aglomeravam ao seu redor se aproximavam, Harry sentiu o chão sob sua cabeça vibrar com a aproximação dos seus passos. Ele voltara ao exterior do labirinto. Via as arquibancadas no alto, os vultos das pessoas que se movimentavam nelas, as estrelas no céu. Harry largou a Taça, mas segurou Cedrico mais junto dele e com mais força. Ergueu a mão livre e agarrou o pulso de Dumbledore, enquanto o rosto do bruxo saía de foco e tornava a entrar.
— Ele voltou — sussurrou Harry — Ele voltou. Voldemort.
— Que está acontecendo? Que está acontecendo?
O rosto de Cornélio Fudge apareceu invertido sobre Harry; parecia pálido e perplexo.
— Meu Deus, Diggory! — murmurou — Dumbledore, ele está morto!
Essas palavras foram repetidas, as sombras que se comprimiam ao redor deles as exclamaram para as mais próximas... depois outras as gritaram, guincharam, para a noite “Ele está morto! Ele está morto! Cedrico Diggory! Morto!”
— Harry, solte-o — ele ouviu Fudge dizer, e sentiu dedos que tentavam forçar os seus a se abrirem para soltar o corpo inerte de Cedrico, mas Harry resistiu.
Então o rosto de Dumbledore, que continuava borrado e difuso, se aproximou.
— Harry, você não pode mais ajudá-lo. Terminou. Solte-o.
— Ele queria que eu o trouxesse de volta — murmurou Harry, pareceu-lhe importante explicar isso — Ele queria que eu o trouxesse de volta para os pais...
— Certo, Harry... agora solte-o...
Dumbledore se curvou e, com uma força extraordinária para um homem tão velho e magro, ergueu Harry do chão e o pôs de pé. Harry oscilou. Sua cabeça latejava com força. Sua perna machucada não queria mais sustentar o seu peso.
As pessoas aglomeradas ao redor se acotovelavam, tentando chegar mais próximo, empurrando sombriamente.
— Que foi que houve?
— Que aconteceu com ele?
— Diggory está morto!
— Ele precisa ir para a Ala Hospitalar! — dizia Fudge em voz alta — Ele está mal, está ferido, Dumbledore, os pais de Diggory estão aqui, estão nas arquibancadas...
— Eu levo Harry, Dumbledore, eu o levo...
— Não, eu prefiro... que deve lhe contar... antes que ele veja...?
— Dumbledore, Amos Diggory está correndo... está vindo para cá.
— Harry, fique aqui...
Garotas gritavam, soluçavam, histéricas...
A cena lampejava estranhamente diante dos olhos de Harry...
— Está tudo bem, filho, estou com você... vamos... Ala Hospitalar...
— Dumbledore disse para eu ficar — disse Harry com a fala pastosa, a palpitação na cicatriz fazendo-o sentir vontade de vomitar, sua visão mais borrada que nunca.
— Você precisa se deitar... vamos, agora...
Alguém maior e mais forte do que ele, meio que o puxou, meio que o carregou entre os espectadores assustados, Harry ouvia as pessoas exclamarem, gritarem e berrarem à medida que o homem que o segurava abria caminho por elas, levando o garoto para o castelo. Atravessaram o gramado, passaram o lago e o navio de Durmstrang, Harry não ouvia nada, exceto a respiração ruidosa do homem que o ajudava a caminhar.
— Que aconteceu, Harry? — perguntou o homem finalmente, erguendo-o para galgar os degraus de pedra da entrada.
Toque. Toque. Toque.
Era Olho-Tonto Moody.
— A Taça era uma Chave de Portal — disse Harry ao atravessarem o Saguão de Entrada — Nos levou para um cemitério... e Voldemort estava lá... Lorde Voldemort...
Toque. Toque. Toque. Escadaria de mármore acima...
— O Lorde das Trevas estava lá? Que aconteceu depois?
— Matou Cedrico... mataram Cedrico...
— E então?
Toque. Toque. Toque. Pelo corredor...
— Preparou uma poção... recuperou o corpo dele...
— O Lorde das Trevas recuperou o corpo? Ele voltou?
— E os Comensais da Morte vieram... depois nós duelamos...
— Você duelou com o Lorde das Trevas?
— Escapei... minha varinha... fez uma coisa engraçada... vi meu pai e minha mãe... eles saíram da varinha dele...
— Aqui dentro, Harry... aqui dentro, e sente-se... você vai ficar bom agora... beba isso...
Harry ouviu uma chave girar na fechadura e sentiu que empurravam um copo em suas mãos.
— Beba isso... você vai se sentir melhor... vamos Harry, preciso saber exatamente o que aconteceu...
Moody ajudou a virar a poção na boca de Harry; o garoto tossiu, um gosto apimentado queimou sua garganta. A sala de Moody entrou em foco, bem como o próprio Moody... ele parecia tão pálido quanto Fudge, e seus dois olhos estavam fixos, sem piscar, no rosto de Harry.
— Voldemort voltou Harry? Você tem certeza de que voltou? Como foi que ele fez isso?
— Ele apanhou uma coisa no túmulo do pai dele, depois do Rabicho e de mim.
Sua cabeça estava clareando, sua cicatriz já não doía tanto, agora conseguia ver o rosto de Moody nitidamente, embora a sala estivesse escura. Ainda se ouviam berros e gritos vindos do distante campo de Quadribol.
— Que foi que o Lorde das Trevas tirou de você? — perguntou Moody.
— Sangue — respondeu Harry erguendo o braço.
A manga estava rasgada no lugar em que o punhal de Rabicho a cortara. Moody deixou escapar um assobio longo e baixo.
— E os Comensais da Morte? Voltaram?
— Voltaram. Montes deles...
— Como foi que ele os tratou? — perguntou Moody baixinho — Ele lhes perdoou?
Mas Harry de repente se lembrou. Devia ter contado a Dumbledore, devia ter dito logo de saída...
— Tem um Comensal da Morte em Hogwarts! Tem um Comensal da Morte aqui, ele pôs o meu nome no Cálice de Fogo, certificou-se de que eu chegasse até o fim...
Harry tentou se levantar, mas Moody o obrigou a sentar-se outra vez.
— Eu sei quem é o Comensal da Morte — disse ele em voz baixa.
— Karkaroff? — disse Harry agitado — Onde é que ele está? O senhor o pegou? Ele está preso?
— Karkaroff? — disse Moody com uma risada estranha — Karkaroff fugiu esta noite, quando sentiu a Marca Negra arder no braço. Ele traiu um número grande demais de seguidores fiéis do Lorde das Trevas para querer reencontrá-los... mas duvido que chegue muito longe. O Lorde das Trevas tem maneiras de seguir seus inimigos.
— Karkaroff foi embora? Fugiu? Mas então... ele não pôs o meu nome no Cálice de Fogo?
— Não — disse Moody lentamente — Não, não pôs. Fui eu quem pôs.
Harry ouviu, mas não acreditou.
— Não, o senhor não pôs. O senhor não fez isso... não pode ter feito...
— Garanto a você que fiz — disse Moody e seu olho mágico deu uma volta completa e se fixou na porta, e Harry percebeu que ele estava se certificando de que não havia ninguém do lado de fora.
Ao mesmo tempo, Moody puxou a varinha e apontou-a para o garoto.
— E ele lhes perdoou, então? Os Comensais da Morte continuaram livres? Os que escaparam de Azkaban?
— Quê? — exclamou Harry.
Ele olhou a varinha que Moody apontava para ele. Aquilo era uma piada de mau gosto, tinha que ser.
— Eu lhe perguntei — disse Moody calmamente — Se ele perdoou a ralé que jamais foi procurá-lo. Aqueles traidores covardes que sequer arriscaram ser mandados para Azkaban por ele. Os porcos desleais e imprestáveis que tiveram coragem suficiente para desfilar de máscaras na Copa Mundial de Quadribol, mas fugiram ao ver a Marca Negra quando eu a projetei no céu.
— O senhor projetou... do que é que o senhor está falando...?
— Eu já lhe disse, Harry... eu já lhe disse. Se tem uma coisa que eu detesto mais no mundo é um Comensal da Morte que foi absolvido. Viraram as costas ao meu amo quando ele mais precisava deles. Eu esperei que ele os castigasse. Esperei que ele os torturasse. Me diga que ele os machucou, Harry...
O rosto de Moody se iluminou de repente com um sorriso demente.
— Me diga que ele disse a todos que eu, somente eu, permaneci fiel... preparado para arriscar tudo para entregar em suas mãos o que ele mais queria... você.
— O senhor não fez... isso, não pode ser o senhor...
— Quem pôs o seu nome no Cálice de Fogo com o nome de uma escola diferente? Fui eu, sim. Quem afugentou cada pessoa que julguei que poderia machucá-lo ou impedir que você ganhasse o torneio? Fui eu, sim. Quem encorajou Hagrid a lhe mostrar os dragões? Fui eu, sim. Quem fez você ver a única maneira de vencer o dragão? Fui eu, sim.
O olho mágico de Moody se desviou então da porta. Fixou-se em Harry. Sua boca torta ria mais desdenhosa e abertamente que nunca.
— Não foi fácil, Harry, orientá-lo durante aquelas tarefas sem despertar suspeitas. Tive de usar cada grama de astúcia que possuo para não deixar transparecer o meu dedo no seu sucesso. Dumbledore teria ficado desconfiadíssimo se você conseguisse tudo com muita facilidade. Desde que você entrasse no labirinto, de preferência com uma boa dianteira, então, eu sabia que teria uma chance de me livrar dos outros campeões e deixar o seu caminho desimpedido. Mas tive também de lutar contra a sua burrice. A Segunda Tarefa... foi a que tive mais medo que você fracassasse. Eu fiquei vigiando-o, Potter. Eu sabia que você não tinha decifrado a pista do ovo, por isso tive que lhe dar mais uma sugestão...
— O senhor não deu — disse Harry rouco — Cedrico me deu a pista...
— Quem disse a Cedrico para abrir o ovo dentro da água? Fui eu. Confiei que ele passaria a informação a você. Gente decente é tão fácil de manipular, Potter. Eu tinha certeza de que Cedrico iria querer retribuir o favor de tê-lo informado sobre os dragões, e foi o que ele fez. Mas, mesmo assim, Potter, parecia que você ia fracassar. Fiquei vigiando-o o tempo todo... todas àquelas horas na Biblioteca. Você não percebeu que o livro de que precisava estava no seu dormitório o tempo todo? Eu o coloquei lá mais cedo, dei-o ao garoto Longbottom, não se lembra? Plantas Mediterrâneas e Suas Propriedades Mágicas. Ele teria lhe informado tudo que você precisava saber sobre o guelricho. Eu esperava que você pedisse ajuda a qualquer um e a todos. Longbottom teria lhe dito na mesma hora. Mas você não pediu... você não pediu... você tem um traço de orgulho e independência que poderia ter estragado tudo. Então o que é que eu podia fazer? Mandar-lhe a informação por intermédio de outra fonte inocente. Você me contou no Baile de Inverno que um elfo doméstico, chamado Dobby, lhe dera um presente de Natal. Eu chamei o elfo à sala dos professores para apanhar umas vestes para lavar. Encenei uma conversa em voz alta com a Profª. McGonagall sobre os reféns que seriam usados na tarefa e se Potter pensaria em comer guelricho. E o seu amiguinho elfo correu direto para o armário de Snape e foi depressa procurar você...
A varinha de Moody continuava apontada diretamente para o coração de Harry. Por cima do ombro do professor, sombras indistintas se moviam no Espelho de Inimigos pendurado na parede.
— Você ficou tanto tempo no lago, Potter, que eu pensei que tinha se afogado. Mas, por sorte, Dumbledore tomou a sua burrice por nobreza e lhe deu uma nota alta. Eu respirei mais uma vez aliviado. Esta noite, você teve uma tarefa mais fácil no labirinto do que deveria, é claro — disse Moody — Isto foi porque eu estava patrulhando do lado de fora, e podia ver as sebes mais externas, e pude destruir muitos obstáculos no seu caminho. Eu estuporei Fleur Delacour quando ela passou. Lancei a Maldição Imperius em Krum para ele acabar com Diggory e deixar o seu caminho livre até a Taça.
Harry encarava Moody. Não conseguia entender como podia ser aquilo... o amigo de Dumbledore, o famoso auror... aquele que capturara tantos Comensais da Morte... não fazia sentido... nem um pingo...
As sombras no Espelho de Inimigos se acentuavam, se tornando mais nítidas. Harry via, por cima do ombro de Moody, o contorno de três pessoas, que se aproximavam cada vez mais. Mas o professor não as vigiava. Seu olho mágico estava fixo em Harry.
— O Lorde das Trevas não conseguiu matá-lo, Potter, e ele queria tanto! — sussurrou Moody — Imagine a recompensa que me dará, quando descobrir que fiz isso por ele. Entreguei-o a ele, a coisa de que ele mais precisava para se regenerar, e depois matei-o para ele. Vou receber mais honrarias do que todos os outros Comensais da Morte. Serei seu seguidor mais querido, mais chegado... mais próximo do que um filho...
O olho normal de Moody estava esbugalhado, o olho mágico fixo em Harry.
A porta continuava trancada e Harry sabia que jamais pegaria a própria varinha a tempo...
— O Lorde das Trevas e eu — disse Moody, e agora parecia completamente enlouquecido, agigantando-se sobre Harry, olhando-o com desdém — Temos muito em comum. Nós dois, por exemplo, tivemos pais que nos desapontaram muito... muito mesmo. Nós dois sofremos a indignidade, Harry, de receber o nome desses pais. E nós dois tivemos o prazer... o imenso prazer... de matar nossos pais para garantir a ascensão contínua da Ordem das Trevas!
— O senhor enlouqueceu — disse Harry, o garoto não conseguiu se conter — O senhor enlouqueceu!
— Enlouqueci, eu? — a voz de Moody se alteou descontrolada — Veremos! Veremos quem enlouqueceu, agora que o Lorde das Trevas voltou, comigo ao seu lado! Ele voltou Harry Potter, você não o derrotou, e agora, eu derroto você!
Moody ergueu a varinha, abriu a boca, Harry mergulhou a mão nas vestes...
Estupefaça!
Houve um lampejo ofuscante de luz vermelha, e, com grande fragor de madeira estilhaçada, a porta da sala de Moody rachou ao meio...
Moody foi atirado de costas ao chão. Harry, ainda fitando o lugar em que estivera o rosto de Moody, viu Alvo Dumbledore, o Prof. Snape e a Profª. McGonagall mirando-o do Espelho de Inimigos.
O garoto virou-se para os lados e viu os três parados à porta, o diretor à frente, a varinha em punho. Naquele momento, Harry compreendeu totalmente, pela primeira vez, por que as pessoas diziam que Dumbledore era o único bruxo que Voldemort temia. A expressão no rosto dele quando olhou para a forma inconsciente de Olho-Tonto Moody era mais terrível do que Harry poderia jamais imaginar. Não havia sorriso bondoso no rosto do diretor, não havia cintilação nos olhos atrás dos óculos. Havia uma fúria gelada em cada ruga daquele rosto velho, ele irradiava uma aura de poder como se Dumbledore desprendesse um calor de brasas vivas.
O Diretor entrou na sala, enfiou um pé sob o corpo inconsciente de Moody e virou-o de barriga para cima, de modo que seu rosto ficasse visível. Snape entrou em seguida, olhando o Espelho de Inimigos, no qual seu próprio rosto ainda era visível, examinando a sala. A Profª. McGonagall dirigiu-se imediatamente a Harry.
— Vamos, Potter — sussurrou ela. A linha fina de seus lábios tremia como se ela estivesse à beira das lágrimas — Vamos... Ala Hospitalar...
— Não — disse Dumbledore energicamente.
— Dumbledore, ele precisa, olhe só para ele, já sofreu bastante esta noite...
— Ele fica Minerva, porque precisa compreender — respondeu o diretor secamente — Compreender é o primeiro passo para aceitar, e somente aceitando ele pode se recuperar. Precisa saber o que o fez passar pela provação desta noite e o porquê.
— Moody — disse Harry. Ele continuava num estado da mais completa descrença — Como pode ter sido Moody?
— Este não é Alastor Moody — disse Dumbledore em voz baixa — Você jamais conheceu Alastor Moody. O verdadeiro Moody não teria retirado você das minhas vistas depois do que aconteceu hoje à noite. No instante em que ele o levou, eu compreendi, e o segui.
Dumbledore se curvou para a forma inerte de Moody e meteu a mão nas vestes do bruxo. Tirou o frasco de bolso de Moody e uma penca de chaves numa argola. Depois se voltou para a Profª. McGonagall e Snape.
— Severo, por favor, vá buscar a Poção da Verdade mais forte que você tiver, depois vá à cozinha e me traga aqui o elfo doméstico chamado Winky. Minerva, por favor, desça à casa de Hagrid, onde você encontrará um enorme cão preto sentado no canteiro de abóboras. Leve o cão ao meu escritório, diga-lhe que irei vê-lo daqui a pouco, depois volte aqui.
Se Snape ou McGonagall acharam essas instruções estranhas, eles ocultaram sua confusão. Os dois se viraram na mesma hora e saíram da sala.
Dumbledore aproximou-se do malão com as sete fechaduras, enfiou a primeira chave na fechadura e abriu-o. O malão continha uma profusão de livros de feitiços. Em seguida o diretor fechou-o, enfiou a segunda chave na segunda fechadura e tornou a abrir o malão. Os livros de feitiços haviam desaparecido, desta vez o malão continha uma variedade de bisbilhoscópios, algumas folhas de pergaminho e penas, e algo que lembrava uma Capa da Invisibilidade.
Harry observou, espantado, Dumbledore enfiar a terceira, quarta, quinta e sexta chaves nas fechaduras e reabrir o malão que, a cada vez, revelava conteúdos diferentes. Por fim, enfiou a sétima chave na fechadura, escancarou a tampa e Harry deixou escapar um grito de assombro.
O garoto deparou com uma espécie de poço, uma sala subterrânea e, deitado no chão, bem um metro abaixo, aparentemente em sono profundo, magro e de aparência faminta, encontrava-se o verdadeiro Olho-Tonto Moody. Faltava-lhe a perna de pau, e a órbita em que deveria estar o olho mágico parecia vazia sob a pálpebra e lhe faltavam chumaços de cabelos grisalhos.
Harry correu os olhos arregalados e perplexos do Moody que dormia no malão para o Moody inconsciente caído no chão da sala.
Dumbledore entrou no malão, desceu o corpo e caiu de leve no chão ao lado do Moody adormecido. Curvou-se para ele.
— Estuporado, controlado pela Maldição Imperius, muito fraco — disse — Naturalmente, precisariam mantê-lo vivo. Harry me atire a capa do impostor, Alastor está congelando. Madame Pomfrey precisara examiná-lo, mas ele não parece correr perigo imediato.
Harry fez o que o diretor lhe pediu, Dumbledore cobriu Moody com a capa, prendeu-a em volta do corpo do bruxo e tornou a sair do malão. Em seguida apanhou o frasco de bolso que estava sobre a escrivaninha, tirou a tampa e virou-o. Um líquido espesso e viscoso se espalhou pelo chão da sala.
— Poção Polissuco, Harry. Vê a simplicidade e a genialidade da coisa. Porque Moody jamais bebe nada a não ser do frasco de bolso, todo mundo sabe disso. O impostor precisou, é claro, manter o verdadeiro Moody por perto para poder continuar a preparar a poção. Está vendo os cabelos dele... — Dumbledore olhou para o Moody no malão — O impostor andou cortando-os o ano inteiro, está vendo as falhas? Mas acho que, na excitação de hoje à noite, o falso Moody talvez tenha esquecido de tomar a poção com a necessária freqüência... na hora certa... a cada hora... veremos.
Dumbledore puxou a cadeira atrás da escrivaninha e se sentou, os olhos fixos no Moody inconsciente no chão. Harry também ficou olhando. Os minutos se passaram em silêncio...
Então, diante dos olhos de Harry, o rosto do homem no chão começou a mudar. As cicatrizes foram desaparecendo, a pele foi se tornando lisa, o nariz mutilado ficou inteiro e começou a diminuir de tamanho. A longa juba de cabelos grisalhos foi se retraindo para o couro cabeludo e se alourando. De repente, com um forte baque, a perna de pau caiu e uma perna normal apareceu em seu lugar; no momento seguinte, o olho mágico saltou do rosto do homem e um olho verdadeiro o substituiu, o olho mágico saiu rolando pelo chão e continuou a girar em todas as direções.
Harry viu caído à sua frente um homem de pele muito clara, ligeiramente sardento, com cabelos bastos e louros. O garoto sabia quem era. Vira-o na Penseira de Dumbledore, assistira a ele ser retirado do tribunal pelos dementadores, tentando convencer o Sr. Crouch de que era inocente... mas agora tinha rugas em torno dos olhos, e parecia bem mais velho...
Ouviram-se passos apressados no corredor. Snape retornava com Winky em seus calcanhares. A Profª. McGonagall vinha logo atrás.
— Crouch! — exclamou Snape, parando de chofre à porta — Bartô Crouch!
— Nossa! — exclamou a Profª. McGonagall, parando de chofre ao ver o homem no chão.
Imunda, descabelada, Winky espiou por entre as pernas de Snape. Ela abriu uma boca enorme e deixou escapar um grito esganiçado.
— Menino Bartô, menino Bartô, que é que o senhor está fazendo aqui?
Ela se atirou ao peito do rapaz.
— Vocês mataram ele! Vocês mataram ele! Vocês mataram o filho do meu amo!
— Ele está apenas estuporado, Winky — disse Dumbledore — Afaste-se, por favor. Severo, trouxe a poção?
Snape entregou a Dumbledore um pequeno frasco com um líquido muito transparente, o Veritaserum que o professor ameaçara fazer Harry beber na sala dele. Dumbledore se levantou, se debruçou sobre o homem e o aprumou contra a parede sob o Espelho de Inimigos, no qual as imagens de Dumbledore, Snape e McGonagall continuavam a observar tudo. Winky permaneceu de joelhos, tremendo, as mãos cobrindo o rosto. Dumbledore abriu a boca do homem à força e despejou nela três gotas da poção. Depois, apontou a varinha para o peito do homem e disse:
Enervate!
O filho de Crouch abriu os olhos. Seu rosto estava flácido, seu olhar desfocado. Dumbledore se ajoelhou diante dele, de modo que seus rostos ficassem no mesmo plano.
— Você está me ouvindo? — perguntou o diretor em voz baixa.
Os olhos do homem piscaram.
— Estou — murmurou.
— Gostaria que nos dissesse — pediu Dumbledore — Como veio parar aqui? Como fugiu de Azkaban?
Crouch inspirou profundamente, estremecendo, e em seguida começou a falar numa voz sem inflexões nem emoção.
— Minha mãe me salvou. Ela sabia que estava morrendo. Convenceu meu pai a me tirar de lá como um último favor. Ele a amava como nunca me amara. E concordou. Os dois foram me visitar. Me deram uma dose da Poção Polissuco, contendo um fio de cabelo de minha mãe. Ela tomou uma dose da poção, contendo um fio de cabelo meu. Assumimos a forma um do outro.
Winky balançava a cabeça, tremendo.
— Não diga mais nada Menino Bartô, não diga mais nada, você está metendo seu pai em confusão!
Mas Crouch inspirou mais uma vez profundamente e continuou com a mesma voz sem emoção.
— Os dementadores são cegos. Eles perceberam uma pessoa saudável e uma pessoa doente entrando em Azkaban. Depois, perceberam uma pessoa saudável e uma pessoa doente deixando a prisão. Meu pai me contrabandeou para fora, disfarçado de minha mãe, para o caso de algum prisioneiro estar observando da cela. Minha mãe morreu pouco depois em Azkaban. Teve o cuidado de beber a Poção Polissuco até o fim. Foi enterrada com o meu nome e a minha aparência. Todos acreditaram que ela era eu.
As pálpebras do homem piscaram.
— E o que foi que seu pai fez com você, quando chegaram em casa? — perguntou Dumbledore.
— Encenou a morte de minha mãe. Um enterro discreto e íntimo. Aquele túmulo está vazio. O elfo doméstico cuidou de mim até eu ficar bom. Depois tive que ser escondido. Tive que ser controlado. Meu pai teve que usar vários feitiços para me dominar. Quando recuperei a saúde, só pensei em encontrar o meu amo... em voltar para o seu serviço.
— Como foi que seu pai o dominou? — perguntou Dumbledore.
— A Maldição Imperius. Fiquei sob o domínio do meu pai. Fui forçado a usar uma Capa da Invisibilidade dia e noite. Sempre em companhia do elfo doméstico. Era ela quem me cuidava e guardava. Tinha pena de mim. Convenceu meu pai a me dar regalias ocasionais. Prêmios pelo meu bom comportamento.
— Menino Bartô, Menino Bartô — soluçou Winky entre os dedos — Você não devia contar a eles, está nos metendo em apuros...
— Alguém descobriu que você continuava vivo? — perguntou Dumbledore brandamente — Alguém sabia disso, além do seu pai e do elfo doméstico?
— Sabia — suas pálpebras tornaram a piscar — Uma bruxa do escritório do meu pai, Berta Jorkins. Ela veio um dia em casa trazer papéis para o meu pai assinar. Ele não estava. Winky mandou-a entrar e voltou para a cozinha, para mim. Mas Berta Jorkins ouviu o elfo conversando comigo. Foi investigar. Ouviu o suficiente para adivinhar que eu estava escondido sob uma Capa da Invisibilidade. Meu pai chegou em casa. Ela o confrontou. Ele lançou nela um Feitiço da Memória fortíssimo para fazê-la esquecer o que descobrira. Forte demais. Ele disse que danificou permanentemente a memória dela.
— Por que ela foi bisbilhotar os negócios particulares do meu amo? — soluçou Winky — Por que não deixou a gente em paz?
— Fale-me sobre a Copa Mundial de Quadribol — ordenou Dumbledore.
— Winky convenceu meu pai — disse Crouch, ainda com a mesma voz monótona — Passou meses persuadindo-o. Eu não saía de casa havia anos. Eu adorava Quadribol. “Deixe o rapaz ir”, dizia ela. “Ele vai usar a Capa da Invisibilidade. Ele pode assistir. Deixe ele tomar um pouco de ar fresco uma vez”. Ela disse que minha mãe teria gostado disso. Disse ao meu pai que minha mãe morrera para me devolver a liberdade. Não me salvara para viver preso. No fim ele concordou. Foi tudo cuidadosamente planejado. Meu pai subiu comigo e Winky ao camarote de honra mais cedo no dia do jogo. Winky devia dizer que estava guardando o lugar para o meu pai. Eu devia ficar sentado ali, invisível. Quando todos tivessem deixado o camarote, nós sairíamos. Winky iria parecer que estava sozinha. Ninguém jamais saberia. Mas Winky não sabia que eu estava bem mais forte. Estava começando a resistir à Maldição Imperius lançada por meu pai. Havia horas em que eu quase voltava a ser eu mesmo. Havia breves lapsos em que eu parecia me libertar do controle dele. Isto aconteceu lá, no camarote de honra. Foi como se eu estivesse saindo de um longo sono. Eu me vi em público, no meio de um jogo, e vi uma varinha saindo do bolso de um garoto na minha frente. Eu não tinha licença de usar uma varinha desde antes de Azkaban. Eu a roubei. Winky não viu. Ela tem medo de alturas. Ficou com o rosto tampado.
— Menino Bartô, que menino danado! — sussurrou Winky, as lágrimas escorrendo entre seus dedos.
— Então você se apoderou da varinha — disse Dumbledore — E o que foi que fez com ela?
— Voltamos à barraca. Então ouvimos os gritos. Ouvimos os Comensais da Morte. Os que nunca tinham ido para Azkaban. Os que nunca tinham sofrido pelo meu amo. Os que tinham lhe virado as costas. Não estavam presos como eu. Estavam livres para ir procurá-lo, mas não fizeram isso. Estavam simplesmente se divertindo com os trouxas. As vozes deles me acordaram. Minha mente estava mais clara do que estivera em anos. Senti raiva. Tinha a varinha. Queria atacá-los pela deslealdade que fizeram ao meu amo. Meu pai saíra da barraca, tinha ido libertar os trouxas. Winky teve medo quando me viu tão furioso. Usou seu próprio tipo de mágica para me prender a ela. Me tirou da barraca, me levou para a floresta, para longe dos Comensais da Morte. Eu tentei impedi-la. Queria voltar para o acampamento. Queria mostrar àqueles Comensais da Morte o que significava lealdade ao Lorde das Trevas, e puni-los por não a terem. Usei a varinha roubada para projetar a Marca Negra no céu. Os bruxos do Ministério chegaram. Lançaram Feitiços Estuporantes para todo lado. Um dos feitiços atravessou as árvores até onde eu e Winky estávamos. O vínculo que nos unia se partiu. Nós dois caímos estuporados. Quando descobriram Winky, meu pai entendeu que eu devia estar por perto. Me procurou no mato em que ela fora encontrada e me descobriu caído no chão. Ele esperou até os outros funcionários do Ministério deixarem a floresta. Tornou a me sujeitar com a Maldição Imperius, e me levou para casa. Despediu Winky. Traíra a confiança dele. Me deixara arranjar uma varinha. Quase me deixara fugir.
Winky deixou escapar um grito de desespero.
— Agora havia apenas meu pai e eu, sozinhos em casa. E, então... — a cabeça de Crouch girou molemente e um sorriso demente se espalhou por seu rosto — Meu amo veio me buscar. Apareceu lá em casa tarde da noite, nos braços do servo dele, Rabicho. Meu amo descobrira que eu continuava vivo. Tinha capturado Berta Jorkins na Albânia. Torturou-a. Ela lhe contou muita coisa. Contou sobre o Torneio Tribruxo. Contou que o antigo auror Moody ia ensinar em Hogwarts. Ele a torturou até conseguir romper o Feitiço da Memória que meu pai lançara nela. Berta contou que eu fugira de Azkaban. Contou que meu pai me mantinha prisioneiro para me impedir de procurar meu amo. Então meu amo soube que eu continuava a ser um servo fiel, talvez o mais fiel de todos. Meu amo concebeu um plano baseado nas informações que Berta lhe dera. Precisava de mim. Chegou em nossa casa por volta da meia-noite. Meu pai atendeu a porta.
O sorriso no rosto de Crouch se alargou, como se ele recordasse o momento mais doce de sua vida. Os olhos castanhos e vidrados de Winky eram visíveis entre seus dedos. Ela parecia assombrada demais para falar.
— Foi muito rápido. Meu amo colocou meu pai sob a Maldição Imperius. Agora meu pai era o prisioneiro, o controlado. Meu amo o forçou a continuar a vida como sempre, a agir como se não houvesse nada errado. E eu fui libertado. Acordei. Voltei a ser eu mesmo, vivo, como não me sentia havia anos.
— E o que foi que Lorde Voldemort lhe pediu para fazer? — perguntou Dumbledore.
— Ele me perguntou se eu estava disposto a arriscar tudo por ele. Eu estava. Era o meu sonho, minha maior ambição, servi-lo, me pôr à prova. Ele me disse que precisava colocar um servo fiel em Hogwarts. Um servo que orientasse Harry Potter durante o Torneio Tribruxo sem parecer que estava fazendo isso. Um servo que vigiasse Harry Potter. Que garantisse que o garoto chegasse à Taça Tribruxo. Que transformasse a Taça em uma Chave de Portal, que levasse a primeira pessoa a tocá-la ao meu amo. Mas primeiro...
— Você precisava de Alastor Moody — disse Dumbledore. Seus olhos azuis faiscando, embora sua voz permanecesse calma.
— Rabicho e eu fizemos isso. Preparamos antes uma Poção Polissuco. Viajamos até a casa do auror. Moody resistiu. Houve uma grande confusão. Conseguimos dominá-lo a tempo. Nós o enfiamos à força no malão mágico. Tiramos alguns fios de cabelo e acrescentamos à poção. Eu a bebi e me transformei no duplo de Moody. Apanhei sua perna e seu olho. Estava pronto para enfrentar Arthur Weasley quando ele viesse resolver o caso com os trouxas que ouviram o estardalhaço. Espalhei as latas de lixo pelo quintal. Contei a Arthur Weasley que tinha ouvido intrusos em volta da casa, e que pusera as latas de lixo em movimento. Então reuni as roupas e os detectores das trevas de Moody, guardei tudo no malão e parti para Hogwarts. Conservei-o vivo, dominado pela Maldição Imperius. Queria poder interrogá-lo. Descobrir o passado dele, aprender seus hábitos, de modo a enganar Dumbledore. Precisava também do cabelo dele para a Poção Polissuco. Os outros ingredientes foram fáceis de encontrar. Roubei pele de ararambóia das masmorras. Quando o Professor de Poções me encontrou na sala dele, eu disse que tinha ordens para revistá-la.
— E o que aconteceu com Rabicho depois que vocês atacaram Moody?
— Rabicho voltou para cuidar do meu amo, lá em casa, e para vigiar meu pai.
— Mas o seu pai fugiu — disse Dumbledore.
— Fugiu. Depois de algum tempo ele começou a resistir à Maldição Imperius, exatamente como eu tinha feito. Havia períodos em que ele sabia o que estava acontecendo. Meu amo achou que não era mais seguro o meu pai sair de casa. Forçou-o, então, a mandar cartas para o Ministério. Fez meu pai escrever dizendo que estava doente. Mas Rabicho não cumpriu seus deveres direito. Não o vigiou o bastante. Meu pai fugiu. Meu amo adivinhou que ele estaria vindo para Hogwarts. Ia admitir que me contrabandeara para fora de Azkaban. Meu amo mandou me avisar da fuga do meu pai. Mandou que eu o detivesse a qualquer custo. Então esperei e fiquei vigiando. Usei o mapa que pedira emprestado a Harry Potter. O mapa que quase pusera tudo a perder.
— Mapa? — perguntou Dumbledore imediatamente — Que mapa é esse?
— O mapa que Potter tem de Hogwarts. Potter me viu nele. Potter me viu roubando ingredientes para a Poção Polissuco da sala de Snape certa noite. Achou que eu era meu pai porque temos o mesmo nome. Apanhei o mapa de Potter naquela mesma noite. Disse a ele que meu pai odiava bruxos das trevas. Potter acreditou que eu estava atrás de Snape. Durante uma semana esperei meu pai aparecer em Hogwarts. Finalmente, uma noite, o mapa me indicou que ele estava entrando na propriedade. Vesti a minha Capa da Invisibilidade e desci ao encontro dele. Ele estava andando pela orla da Floresta. Então chegaram Potter e Krum. Esperei. Não podia machucar Potter, meu amo precisava dele. Potter foi correndo buscar Dumbledore. Eu estuporei Krum. Matei meu pai.
— Nããão! — gritou Winky — Menino Bartô, menino Bartô, o que é que você está dizendo?
— Você matou seu pai — repetiu Dumbledore, no mesmo tom brando — Que foi que você fez com o corpo?
— Levei-o para a Floresta. Cobri-o com a Capa da Invisibilidade. Tinha o mapa comigo. Acompanhei Potter entrar correndo no castelo. Ele encontrou Snape. Dumbledore se juntou aos dois. Acompanhei Potter deixar o castelo com Dumbledore. Saí da Floresta, dei a volta por trás deles e fui reencontrá-los. Disse a Dumbledore que Snape me informara aonde vir. Dumbledore me mandou ir procurar meu pai. Voltei para onde deixara o corpo dele. Fiquei observando o mapa. Quando todos tinham ido embora, transformei o corpo do meu pai. Transformei-o em osso... e, sempre vestindo a Capa da Invisibilidade, eu o enterrei na terra fofa diante da cabana de Hagrid.
Fez-se um silêncio profundo, exceto pelos soluços contínuos de Winky.
Então Dumbledore falou:
— E hoje à noite...
— Eu me ofereci para levar a Taça Tribruxo para o labirinto antes do jantar — sussurrou Bartô Crouch — Transformei-a em uma Chave de Portal. O plano do meu amo deu resultado. Ele voltou ao poder e eu vou receber honrarias que ultrapassam os sonhos de qualquer bruxo.
O sorriso demente iluminou mais uma vez suas feições e sua cabeça pendeu para o ombro, enquanto Winky continuava a se lamentar e a soluçar ao seu lado.









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sexta-feira, 29 de junho de 2012

Harry Potter e o Cálice de Fogo - Capítulo 34





— CAPÍTULO TRINTA E QUATRO —
Priori Incantatem



RABICHO APROXIMOU-SE DE HARRY, que tentou se aprumar para sustentar o corpo antes que as cordas fossem desamarradas. Rabicho ergueu a nova mão prateada, puxou o chumaço de pano que amordaçava Harry e então, com um único movimento, cortou as cordas que prendiam o garoto à lápide.
Houve talvez uma fração de segundo em que Harry poderia ter pensado em fugir, mas sua perna machucada estremeceu sob o peso do corpo quando ele firmou os pés no túmulo malcuidado, ao mesmo tempo que os Comensais da Morte cerraram fileiras, apertando o círculo em torno dele e de Voldemort, e os espaços que seriam dos Comensais da Morte ausentes se fecharam. Rabicho saiu do círculo e foi até onde jazia o corpo de Cedrico, e voltou trazendo a varinha de Harry, que ele enfiou com brutalidade na mão do garoto sem sequer olhá-lo. Depois, Rabicho retomou seu lugar no círculo de comensais que observavam.
— Você aprendeu a duelar, Harry Potter? — perguntou Voldemort suavemente, seus olhos vermelhos brilhando no escuro.
Ao ouvir a pergunta Harry se lembrou, como se pertencesse a uma vida anterior, do Clube dos Duelos em Hogwarts que ele freqüentara brevemente há dois anos... a única coisa que aprendera tinha sido o Feitiço para Desarmar.
“Expelliarmus?”... e de que adiantaria isso, mesmo que ele pudesse privar Voldemort de sua varinha, quando ele estava rodeado de Comensais da Morte e em desvantagem de, no mínimo, trinta a um? Ele jamais aprendera nada que o tivesse preparado minimamente para uma situação dessas. Sabia que estava enfrentando aquilo contra o qual Moody sempre o alertara... a Maldição Avada Kedavra, impossível de bloquear... e Voldemort tinha razão, desta vez a mãe de Harry não estava ali para morrer por ele... não contava com proteção alguma...
— Nos cumprimentamos com uma curvatura, Harry — disse Voldemort, se inclinando ligeiramente, mas mantendo o rosto de cobra erguido para Harry — Vamos, as boas maneiras devem ser observadas... Dumbledore gostaria que você demonstrasse educação... curve-se para a morte, Harry...
Os Comensais da Morte deram novas gargalhadas. A boca sem lábios de Voldemort riu. Harry não se curvou. Não ia deixar o bruxo brincar com ele antes de matá-lo... não ia lhe dar essa satisfação...
— Eu disse, curve-se — repetiu Voldemort, erguendo a varinha, e Harry sentiu sua coluna se curvar como se uma mão enorme e invisível o empurrasse impiedosamente para frente, e os Comensais da Morte riram com mais gosto que nunca — Muito bem — disse Voldemort suavemente, e quando ele baixou a varinha a pressão que empurrava Harry se aliviou também — Agora você me enfrenta, como homem... de costas retas e orgulhoso, do mesmo modo que seu pai morreu... agora... vamos ao duelo.
O bruxo ergueu a varinha antes que Harry pudesse fazer alguma coisa para se defender, antes que pudesse sequer se mexer, e ele foi atingido pela Maldição Cruciatus. A dor foi tão intensa, e tão devoradora, que Harry já nem sabia onde estava... facas em brasa perfuravam cada centímetro de sua pele, sua cabeça, sem dúvida alguma, ia explodir de dor, ele gritava mais alto do que jamais gritara na vida...
Então tudo parou. Harry se virou e tentou ficar em pé, tremeu descontrolado, como fizera Rabicho quando decepara a própria mão, cambaleou para os lados na direção dos Comensais da Morte ao redor, e eles o empurraram de volta a Voldemort.
— Uma pequena pausa — disse o bruxo, as narinas de cobra se dilatando de excitação — Uma pequena pausa... isso doeu, não foi Harry? Você não quer que eu faça isso outra vez, quer?
Harry não respondeu. Ia morrer como Cedrico, era o que aqueles olhos vermelhos e cruéis estavam lhe dizendo... Ia morrer, e não havia nada que pudesse fazer para evitá-lo... mas não ia facilitar. Não ia obedecer a Voldemort... não ia suplicar...
— Perguntei se quer que eu faça isso outra vez — disse Voldemort gentilmente — Responda! Imperio!
E Harry teve, pela terceira vez em sua vida, a sensação de que todos os pensamentos tinham se apagado de sua mente... ah, foi uma felicidade, não pensar, foi como se estivesse flutuando, sonhando...
Apenas responda “não”!... Diga “não”!... apenas responda “não”!
“Não direi”, falou uma voz mais forte no fundo de sua cabeça, “Não responderei...”
Apenas responda “não”!...
“Não vou responder, não vou dizer isso...”
Apenas responda “não “!
— NÃO VOU RESPONDER!
E essas palavras explodiram da boca de Harry, ecoaram pelo cemitério, e o estado onírico em que mergulhara se dissolveu repentinamente como se tivessem lhe atirado um balde de água fria, renovaram-se as dores que a Maldição Cruciatus deixara por todo o seu corpo, renovou-se a consciência de onde estava, do que estava enfrentando...
— Não vai? — disse Voldemort suavemente, e agora os Comensais da Morte não estavam rindo — Não vai dizer “não”? Harry, a obediência é uma virtude que preciso lhe ensinar antes de você morrer... talvez mais uma dosezinha de dor?
Voldemort ergueu a varinha, mas desta vez Harry estava preparado, com os reflexos nascidos da prática de Quadribol, ele se atirou para um lado no chão, rolou para trás da lápide de mármore do pai de Voldemort e a ouviu rachar quando o feitiço errou o alvo.
— Não estamos brincando de esconde-esconde, Harry — disse a voz suave e fria de Voldemort, aproximando-se, enquanto os Comensais da Morte riam — Você não pode se esconder de mim. Será que isso significa que já se cansou do nosso duelo? Será que significa que você prefere que eu o encerre agora, Harry? Saia daí, Harry... saia e venha brincar, então... será rápido... talvez até indolor... eu não saberia dizer... eu nunca morri...
Harry continuou agachado atrás da lápide e percebeu que chegara o seu fim. Não havia esperança... nenhuma ajuda de ninguém. Quando ouviu Voldemort chegar ainda mais perto, ele soube apenas uma coisa que transcendeu o medo e a razão, ele não ia morrer agachado ali como uma criança brincando de esconde-esconde; não ia morrer ajoelhado aos pés de Voldemort... ia morrer de pé como seu pai, e ia morrer tentando se defender, mesmo que não houvesse defesa alguma possível...
Antes que Voldemort pudesse meter a cara viperina atrás da lápide, Harry se levantou... agarrou a varinha com força, empunhou-a à frente e saiu rápido detrás da lápide para encarar Voldemort. O bruxo estava pronto.
Quando Harry gritou “Expelliarmus!”, Voldemort gritou “Avada Kedavra!”
Um jorro de luz verde saiu da varinha de Voldemort na mesma hora em que um jorro de luz vermelha disparou da de Harry, e os dois se encontraram no ar, e de repente, a varinha de Harry começou a vibrar como se uma descarga elétrica estivesse entrando por ela, sua mão estava presa à varinha, ele não teria podido soltá-la se quisesse, e um fino feixe de luz agora ligava as duas varinhas, nem vermelha nem verde, mas um dourado intenso e rico, e Harry, acompanhando o feixe com o olhar espantado, viu que os dedos longos e brancos de Voldemort também agarravam uma varinha que sacudia e vibrava.
E então, nada poderia ter preparado Harry para isso, ele sentiu seus pés se elevarem do chão. Ele e Voldemort estavam sendo erguidos no ar, as varinhas ainda ligadas por aquele fio de luz dourada e tremeluzente. Os dois estavam se afastando do túmulo do pai de Voldemort e por fim pousaram num trecho de terreno limpo e sem túmulos...
Os Comensais da Morte gritavam, pedindo instruções a Voldemort, se aproximavam e se reagrupavam em um círculo em volta dos dois, a cobra em seus calcanhares, alguns bruxos sacando as varinhas...
O fio dourado que ligava Harry e Voldemort se fragmentou: embora as varinhas continuassem ligadas, mil outros fios brotaram e formaram um arco sobre os dois, e foram se entrecruzando a toda volta, até encerrá-los em uma teia dourada como uma redoma, uma gaiola de luz, para além da qual os Comensais da Morte rondavam como chacais, seus gritos estranhamente abafados...
— Não façam nada! — gritou Voldemort para os Comensais da Morte, e Harry viu os olhos vermelhos do bruxo se arregalarem para o que estava acontecendo, viu-o lutar para romper o fio de luz que continuava ligando sua varinha à de Harry.
O garoto apertou a varinha com mais força, com as duas mãos, e o fio dourado continuou inteiro.
— Não façam nada a não ser que eu mande! — gritou Voldemort para os Comensais da Morte.
Então um som belo e sobrenatural encheu o ar... vinha de cada fio de luz da teia que vibrava em torno de Harry e Voldemort. Era um som que o garoto reconhecia, embora só o tivesse ouvido uma vez na vida...
A canção da fênix...
Era o som da esperança para Harry... o mais belo e mais bem-vindo que ele já ouvira na vida... o garoto teve a sensação de que o som estava dentro dele e não apenas à sua volta... era o som que ele associava a Dumbledore, e era quase como se um amigo estivesse falando em seu ouvido...
Não rompa a ligação.
— Eu sei — Harry disse à música — Eu sei que não devo...
Mas mal acabara de dizer isso, e a coisa se tornou muito mais difícil de fazer. Sua varinha começou a vibrar mais violentamente do que antes... e agora o fio de luz entre ele e Voldemort mudou também... era como se grandes contas de luz estivessem deslizando para frente e para trás no fio que ligava as varinhas, Harry sentiu a sua estremecer com força, quando as contas de luz começaram a deslizar lenta e continuamente em sua direção... agora o movimento do feixe de luz vinha de Voldemort para ele, e ele sentiu a varinha vibrar de indignação...
Quando a conta de luz mais à frente se aproximou da ponta da varinha de Harry, a madeira em seus dedos esquentou de tal forma que o garoto receou que ela fosse romper em chamas. Quanto mais perto chegava a conta, mais violentamente a varinha de Harry vibrava, ele tinha certeza de que sua varinha não sobreviveria a um contato direto com a conta, ela parecia prestes a se esfacelar sob seus dedos...
Harry concentrou cada partícula de sua mente em obrigar a conta a voltar para Voldemort, seus ouvidos tomados pela canção da fênix, seus olhos furiosos, fixos... e lentamente, muito lentamente, as contas estremeceram e pararam, e em seguida, de forma igualmente lenta, começaram a se deslocar para o lado oposto... e foi a varinha de Voldemort que começou a vibrar com muita violência...
Voldemort que parecia perplexo e quase temeroso...
Uma das contas de luz estremecia a centímetros da ponta da varinha de Voldemort. Harry não entendia por que estava fazendo aquilo, não sabia o que obteria... mas começou a se concentrar, como nunca fizera na vida, em forçar aquela conta de luz a voltar à varinha de Voldemort... e lentamente... muito lentamente... ela foi se deslocando pelo fio dourado... estremeceu por um momento... e então fez contato...
Na mesma hora, a varinha de Voldemort começou a emitir gritos ressonantes de dor... depois... os olhos vermelhos do bruxo se arregalaram de choque, uma mão, densa e fumegante voou da ponta da varinha e desapareceu... o fantasma da mão que ele fizera para Rabicho... mais gritos de dor... e então algo muito maior começou a brotar da ponta da varinha de Voldemort, algo imenso e acinzentado, algo que parecia ser feito da mais sólida e densa fumaça... era uma cabeça, depois um peito e os braços... o tronco de Cedrico Diggory.
Se em algum momento Harry pudesse ter soltado a varinha de susto, teria sido então, mas o instinto o fez continuar segurando-a com força, de modo que o fio de luz dourada permaneceu intacto, embora o fantasma cinzento e denso de Cedrico Diggory (Seria um fantasma? Parecia tão sólido!) emergisse em sua inteireza da ponta da varinha de Voldemort, como se estivesse se espremendo para fora de um túnel muito estreito... e esta sombra de Cedrico ficou em pé e examinou o fio de luz dourada de uma ponta a outra e falou.
— Agüenta firme, Harry.
Era uma voz distante como um eco, Harry olhou para Voldemort... os olhos vermelhos e arregalados do bruxo ainda expressavam choque... tal qual Harry, ele não esperara uma coisa daquelas... e, muito indistintamente, Harry ouviu os gritos amedrontados dos Comensais da Morte, rodeando a redoma dourada...
Novos gritos de dor da varinha... então mais uma coisa surgiu em sua ponta... a sombra densa de uma segunda cabeça, rapidamente seguida de braços e tronco... um velho que Harry vira uma vez em sonho tentava agora sair da ponta da varinha do mesmo modo que Cedrico o fizera... e seu fantasma, ou sua sombra, ou o que fosse, caiu ao lado do de Cedrico, examinou Harry e Voldemort, a teia dourada e as varinhas que se tocavam, levemente surpreso, apoiando-se em uma bengala...
— Então ele era um bruxo de verdade? — perguntou o velho, com os olhos em Voldemort — Me matou, esse aí... enfrenta ele, moleque...
Mas já, outra cabeça vinha surgindo... e esta, grisalha como uma estátua de fumaça, era de uma mulher... Harry, os dois braços trêmulos com o esforço para manter a varinha parada, viu a mulher cair ao chão e se aprumar como tinham feito os outros, examinando tudo com atenção... a sombra de Berta Jorkins contemplou a luta diante dela de olhos arregalados.
— Não solte! — exclamou, e sua voz ecoou como a de Cedrico, como se viesse de muito longe — Não deixe ele pegar você, Harry, não solte a varinha!
Ela e as outras duas sombras começaram a rodear as paredes da teia dourada ao mesmo tempo que os Comensais da Morte se moviam rapidamente pelo lado de fora... e, enquanto rodeavam os duelistas, as vítimas de Voldemort sussurravam palavras de estímulo a Harry e sibilavam outras, que Harry não podia ouvir, para Voldemort.
Agora, outra cabeça vinha emergindo da ponta da varinha do bruxo... e Harry soube, ao vê-la, quem seria... ele sabia, como se esperasse isso desde o momento em que Cedrico saíra da varinha... soube por que a mulher que apareceu era aquela em quem ele pensara mais do que em qualquer outra pessoa esta noite...
A sombra esfumaçada de uma mulher jovem de cabelos longos caiu no chão como fizera Berta, se endireitou e olhou para ele... e Harry, com os braços tremendo loucamente agora, retribuiu o olhar do rosto fantasmagórico de sua mãe.
— Seu pai está vindo... — disse ela baixinho — Ele quer ver você... vai dar tudo certo... agüente firme...
E ele veio... primeiro a cabeça, depois o corpo... alto, os cabelos rebeldes como os de Harry, a sombra esfumaçada de Tiago Potter brotou da ponta da varinha de Voldemort, caiu ao chão e se levantou como havia feito sua mulher. Ele se aproximou de Harry fitando o filho, e falou na mesma voz distante e ressonante como os demais, mas em tom baixo, de modo que Voldemort, agora com o rosto lívido de medo ao ver suas vítimas a rodeá-lo, não pudesse ouvir...
— Quando a ligação for interrompida, permaneceremos apenas uns momentos... mas vamos lhe dar tempo... você precisa chegar à Chave do Portal, ela o levará de volta a Hogwarts... entendeu Harry?
— Entendi — ofegou Harry, lutando para manter firme a varinha, que agora começava a escapar e a escorregar sob seus dedos.
— Harry... — sussurrou a figura de Cedrico — Por favor, leva o meu corpo com você? Leva o meu corpo para os meus pais...
— Levo — prometeu Harry, seu rosto contraído com o esforço de agüentar a varinha.
— Faça isso agora — sussurrou seu pai — Prepare-se para correr... faça isso agora...
— AGORA! — berrou Harry, de qualquer modo, ele não achava que pudesse continuar segurando a varinha nem mais um instante, ergueu-a no ar, com um puxão violento, e o fio dourado se rompeu, a gaiola de luz desapareceu, a música da fênix silenciou, mas as sombras das vítimas de Voldemort não desapareceram, avançaram para o bruxo, escondendo Harry do seu olhar...
E Harry correu como nunca correra na vida, derrubando dois Comensais da Morte abobados ao passar, depois ziguezagueou por trás de lápides, sentindo maldições acompanharem-no, ouvindo-as bater nas lápides, evitou maldições e túmulos, correndo em direção ao corpo de Cedrico, sem sequer sentir a perna doer, todo o seu ser se concentrando no que precisava fazer...
— Estupore-o!— ele ouviu Voldemort gritar.
A dez passos de Cedrico, Harry mergulhou atrás de um anjo de mármore para evitar os jorros de luz vermelha e viu a ponta da asa do anjo desmoronar ao ser atingida pelos feitiços. Apertando com mais força a varinha, ele saiu ligeiro de trás do anjo...
— Impedimenta!— berrou ele, apontando a varinha de qualquer jeito por cima do ombro na direção geral dos Comensais da Morte que corriam em seu encalço.
Por um grito abafado que ouviu, ele achou que conseguira fazer parar pelo menos um, mas não havia tempo para se deter e olhar, ele saltou por cima da Taça e mergulhou ao ouvir mais explosões saírem das varinhas às suas costas, mais jorros de luz voaram por cima de sua cabeça quando ele caiu, esticando a mão para agarrar o braço de Cedrico...
— Afastem-se! Eu o matarei! Ele é meu! — gritou a voz aguda de Voldemort.
A mão de Harry se fechou no pulso de Cedrico, havia uma lápide entre ele e Voldemort, mas Cedrico era demasiado pesado para carregar, e a Taça estava fora do seu alcance...
Os olhos vermelhos de Voldemort chispavam no escuro. Harry viu a boca do bruxo se crispar num sorriso e viu-o erguer a varinha.
— Accio! — berrou Harry, apontando a própria varinha para a Taça Tribruxo.
A Taça voou pelo ar em sua direção, Harry agarrou-a pela asa...
Ele ouviu o grito de fúria de Voldemort no mesmo instante em que sentiu o solavanco no umbigo que significava que a Chave do Portal fora acionada... ele se afastou em alta velocidade num turbilhão de vento e cor, levando Cedrico junto...
Os dois estavam voltando...








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quinta-feira, 28 de junho de 2012

Harry Potter e o Cálice de Fogo - Capítulo 33





— CAPÍTULO TRINTA E TRÊS —
Os Comensais da Morte



VOLDEMORT DESVIOU O OLHAR DE HARRY e começou a examinar o próprio corpo. Suas mãos eram como aranhas grandes e pálidas, seus longos dedos brancos acariciaram o próprio peito, os braços, o rosto, os olhos vermelhos, cujas pupilas eram fendas, como as de um gato, brilhavam ainda mais no escuro. Ele ergueu as mãos e flexionou os dedos com uma expressão arrebatada e exultante. Não deu a menor atenção a Rabicho, que continuou tremendo e sangrando no chão, nem à enorme cobra, que reapareceu em cena e recomeçou a descrever círculos em torno de Harry, sibilando.
Voldemort enfiou um dos dedos anormalmente longos em um bolso fundo e tirou uma varinha. Acariciou-a gentilmente também, depois ergueu-a e apontou-a para Rabicho, e ela o guindou do chão e atirou contra a lápide a que Harry estava amarrado, o bruxo caiu aos pés da lápide e ficou ali, encolhido, chorando.
Voldemort voltou seus olhos vermelhos para Harry e soltou uma risada, aquela sua risada aguda, fria e sem alegria. As vestes de Rabicho agora estavam manchadas de sangue brilhante, o bruxo enrolara nelas o toco de braço.
— Milorde... — disse ele com a voz embargada — Milorde... o senhor prometeu... o senhor prometeu...
— Estique o braço — disse Voldemort indolentemente.
— Ah, meu amo... obrigado, meu amo...
Rabicho esticou o toco sangrento, mas Voldemort deu uma gargalhada.
— O outro braço, Rabicho.
— Meu amo, por favor... por favor...
Voldemort se curvou e puxou o braço esquerdo de Rabicho, empurrou a manga das vestes do servo acima do cotovelo e Harry viu que havia uma coisa na pele, uma coisa que lembrava uma tatuagem vermelho-vivo, um crânio, com uma cobra saindo da boca, a mesma imagem que aparecera no céu na Copa Mundial de Quadribol: a Marca Negra. Voldemort examinou-a demoradamente, sem dar atenção ao choro descontrolado de Rabicho.
— Reapareceu — comentou ele baixinho — Todos deverão ter notado... e agora, veremos... agora saberemos...
Ele comprimiu a marca no braço do servo com seu longo indicador branco.
A cicatriz na testa de Harry ardeu com uma dor aguda e Rabicho deixou escapar um uivo. Voldemort afastou o dedo da marca em Rabicho e Harry viu que ela se tornara muito preta. Com uma expressão de cruel satisfação no rosto, Voldemort se endireitou, atirou a cabeça para trás e começou a examinar o escuro cemitério.
— Quantos terão suficiente coragem para voltar quando sentirem isso? — sussurrou ele, fixando seus olhos vermelhos e brilhantes nas estrelas — E quantos serão bastante tolos para ficar longe de mim?
Ele começou a andar de um lado para outro diante de Harry e Rabicho, seus olhos percorrendo o cemitério todo o tempo. Decorrido pouco mais de um minuto, ele tornou a olhar para Harry, um sorriso cruel deformando seu rosto viperino.
— Você está em pé, Harry Potter, sobre os restos mortais do meu pai — sibilou ele baixinho — Um trouxa e um idiota... muito parecido com a sua querida mãe. Mas os dois tiveram sua utilidade, não? Sua mãe morreu tentando defendê-lo quando criança... e eu matei meu pai e veja como ele se provou útil, depois de morto...
Voldemort soltou outra gargalhada. Para cima e para baixo ele andava, olhando para os lados, e a serpente continuava a circular no meio do capim.
— Você está vendo aquela casa lá na encosta do morro, Potter? Meu pai morava ali. Minha mãe, uma bruxa que vivia no povoado, se apaixonou por ele. Mas foi abandonada quando lhe contou o que era... ele não gostava de magia, meu pai... ele a abandonou e voltou para os pais trouxas antes de eu nascer, Potter, e ela morreu me dando à luz, me deixando para ser criado em um orfanato de trouxas... mas eu jurei encontrá-lo... vinguei-me dele, desse idiota que me deu seu nome... Tom Riddle...
E andava sem parar, seus olhos correndo de um túmulo para outro.
— Me vejam só recordando minha história de família... — comentou ele baixinho — Ora, ora, estou ficando muito sentimental... mas veja Harry! A minha família verdadeira está chegando...
O ar se encheu repentinamente com o rumor de capas esvoaçantes. Entre os túmulos, atrás do teixo, em cada espaço escuro, havia bruxos aparatando... todos usavam capuzes e máscaras. E um por um, eles se adiantaram... lentamente, cautelosamente, como se mal conseguissem acreditar no que viam.
Voldemort ficou parado em silêncio, esperando-os. Então um Comensal da Morte se prostrou de joelhos, arrastou-se até Voldemort, e beijou a barra de suas vestes negras.
— Meu amo... meu amo...
Os Comensais da Morte que vinham atrás o imitaram, um por um, eles se aproximaram de joelhos para beijar as vestes de Voldemort para depois recuar e se levantar, formando um círculo silencioso em torno do túmulo de Tom Riddle, Harry, Voldemort e o monte de vestes que soluçava e sacudia, que era Rabicho. Mas eles deixaram espaços vazios no círculo, como se esperassem mais gente.
Voldemort, porém, não parecia esperar mais ninguém. Olhou os rostos encapuzados ao seu redor e, embora não houvesse vento, um rumorejo pareceu percorrer o círculo como se perpassasse por ele um arrepio.
— Bem vindos, Comensais da Morte — disse Voldemort em voz baixa — Treze anos... treze anos desde que nos encontramos pela última vez. Contudo, vocês atendem ao meu chamado como se fosse ontem... então continuamos unidos sob a Marca Negra! Ou será que não?
Ele retomou sua expressão ameaçadora e farejou, dilatando as narinas em forma de fenda.
— Sinto cheiro de culpa — disse ele — Há um fedor de culpa no ar.
Um segundo surto de arrepios percorreu o círculo, como se cada membro tivesse o desejo, mas não a coragem, de se afastar dali.
— Vejo todos vocês, inteiros e saudáveis, com os seus poderes intactos, tão desenvoltos! E me pergunto... por que esse bando de bruxos nunca foi socorrer seu amo, a quem jurou lealdade eterna?
Ninguém falou. Ninguém se mexeu exceto Rabicho, que continuava no chão, chorando, o braço ensangüentado.
— E eu próprio respondo — sussurrou Voldemort — Porque devem ter acreditado que eu estava derrotado, pensaram que eu acabara. Voltaram a se misturar com os meus inimigos e alegaram inocência, ignorância e bruxaria... e então eu me pergunto, mas como é que vocês podem ter acreditado que eu não me reergueria? Vocês, que conheciam as providências que eu tomara, há muito tempo, para me proteger da morte humana? Vocês que tiveram provas da imensidão do meu poder, na época em que fui mais poderoso do que qualquer bruxo vivente? E eu mesmo respondo, talvez acreditassem que poderia haver um poder ainda maior, um poder capaz de derrotar até Lorde Voldemort... talvez vocês agora prestem lealdade a outro... talvez àquele campeão da plebe, dos trouxas e sangue ruins, Alvo Dumbledore?
À menção do nome de Dumbledore, os membros do circulo se inquietaram, alguns murmuraram e negaram sacudindo a cabeça.
Voldemort ignorou-os.
— Um desapontamento para mim... confesso que estou desapontado...
Um dos bruxos se atirou subitamente à frente, rompendo o círculo. Tremendo da cabeça aos pés, prostrou-se aos pés de Voldemort.
— Meu amo! — exclamou — Meu amo, me perdoe! Nos perdoe todos!
Voldemort começou a rir. Ergueu a varinha.
Crucio!
O Comensal da Morte no chão contorceu-se e gritou, Harry teve certeza de que o som se propagava até as casas vizinhas... Tomara que a polícia chegue, desejou ele desesperado... Alguém... alguma coisa...
Voldemort ergueu a varinha. O Comensal da Morte torturado se estatelou no chão, arfando.
— Levante-se, Avery — disse Voldemort baixinho — Ponha-se de pé. Você está me pedindo perdão? Eu não perdôo. Eu não esqueço. Treze longos anos... quero um pagamento por esses treze anos antes de perdoar-lhes. Rabicho aqui já pagou parte da dívida, não foi, Rabicho?
Ele baixou os olhos para o bruxo mutilado, que continuava a soluçar.
— Você voltou para mim, não por lealdade, mas por medo dos seus antigos amigos. Você merece sentir dor, Rabicho. Você sabe disso, não sabe?
— Sei, meu amo — gemeu Rabicho — Por favor, meu amo... por favor...
— Contudo você me ajudou a recuperar meu corpo — disse Voldemort friamente, observando o servo soluçar no chão — Mesmo inútil e traiçoeiro como é, você me ajudou... e Lorde Voldemort recompensa quem o ajuda...
Voldemort tornou a erguer a varinha e girou-a no ar. Um fio que parecia feito de prata liquefeita prolongou-se da varinha e pairou no ar. Momentaneamente informe, o fio se agitou e em seguida se transformou na réplica brilhante de uma mão humana, clara como o luar, que saiu voando e foi se prender ao pulso sangrento de Rabicho.
Os soluços do bruxo pararam abruptamente. Com a respiração rascante e falha, ele levantou a cabeça e fitou, incrédulo, a mão prateada, agora ligada sem costura ao seu braço, como se ele estivesse usando uma luva luminosa. O bruxo flexionou os dedos reluzentes, depois, trêmulo, apanhou um graveto no chão e pulverizou-o.
— Milorde — sussurrou ele — Meu amo... é linda... muito obrigado... muito obrigado...
Ele avançou de joelhos e beijou a barra das vestes de Voldemort.
— Que a sua lealdade jamais volte a vacilar, Rabicho — disse Voldemort.
— Não, milorde... nunca, milorde...
Rabicho se levantou e tomou posição no círculo, sem tirar os olhos da mão nova e poderosa, seu rosto lavado de lágrimas.
Voldemort se aproximou então do homem à direita de Rabicho.
— Lúcio, meu ardiloso amigo — murmurou ele se detendo diante do bruxo — Ouço dizer que você não renunciou aos seus hábitos antigos, embora para o mundo você apresente uma imagem respeitável. Acredito que continue pronto para assumir a liderança de uma torturazinha de trouxas? No entanto você nunca tentou me encontrar, Lúcio... as suas aventuras na Copa Mundial de Quadribol foram engraçadas, devo dizer... mas será que suas energias não teriam sido melhor empregadas em procurar ajudar seu amo?
— Milorde, sempre estive constantemente alerta — ouviu-se na mesma hora a voz de Lúcio Malfoy saindo por baixo do capuz — Se tivesse havido algum sinal do senhor, algum rumor sobre seu paradeiro, eu teria ido imediatamente para o seu lado, nada teria me detido...
— Contudo, você correu da minha marca, quando um leal Comensal da Morte a projetou no céu no verão passado — comentou displicentemente Voldemort, e o Sr. Malfoy parou abruptamente de falar — É, sei de tudo que aconteceu, Lúcio... você me desapontou... espero serviços mais leais no futuro.
— Naturalmente, milorde, naturalmente... o senhor é misericordioso, obrigado...
Voldemort continuou a andar e parou, reparando no espaço, suficientemente grande para duas pessoas, que separava Malfoy do comensal seguinte.
— Os Lestrange deveriam estar aqui — disse Voldemort baixinho — Mas estão enterrados vivos em Azkaban. Foram fiéis. Preferiram ir para Azkaban a renunciar a mim... quando Azkaban for aberta, os Lestrange receberão honras que ultrapassarão todos os seus sonhos. Os dementadores se unirão a nós... são nossos aliados naturais... chamaremos de volta os gigantes banidos... todos os meus servos devotados me serão devolvidos e um exército de criaturas que todos temem...
Ele continuou sua caminhada. Passou por alguns comensais em silêncio, mas parou diante de outros para lhes falar.
— Macnair... eliminando animais perigosos para o Ministério da Magia agora, segundo me conta Rabicho. Breve você terá melhores vítimas, Macnair. Lorde Voldemort irá providenciá-las...
— Obrigado, meu amo... obrigado — murmurou Macnair.
— E aqui — Voldemort prosseguiu dirigindo-se aos dois maiores vultos encapuzados — Temos Crabbe... você vai trabalhar melhor desta vez, não vai, Crabbe? E você, Goyle?
Os dois fizeram uma reverência desajeitada, murmurando com uma certa lentidão:
— Sim, meu amo...
— Trabalharemos, meu amo...
— O mesmo se aplica a você, Nott — disse Voldemort baixinho, ao passar pelo vulto curvado à sombra do Sr. Goyle.
— Milorde, eu me prostrei diante do senhor, sou o seu mais fiel...
— Basta — disse Voldemort.
Ele chegou, então, à maior lacuna no círculo, e parou contemplando-a com seus olhos parados e vermelhos, como se pudesse ver pessoas em pé ali.
— E aqui temos seis Comensais da Morte ausentes... três mortos a meu serviço. Um demasiado covarde para voltar... ele me pagará. Um que eu acredito ter me deixado para sempre... este será morto, é claro... e um que continua sendo meu mais fiel servo, e que já reingressou no meu serviço.
Os Comensais da Morte se agitaram, Harry viu que eles se entreolhavam por trás das máscaras.
— Ele está em Hogwarts, esse servo fiel, e foi graças aos seus esforços que o nosso jovem amigo chegou aqui esta noite... sim — disse Voldemort, um sorriso crispando sua boca sem lábios, quando os olhares do círculo convergiram para Harry — Harry Potter teve a gentileza de se reunir a nós para comemorar a minha ressurreição. Poderíamos até chamá-lo de meu convidado de honra.
Fez-se silêncio. Em seguida o Comensal da Morte à direita de Rabicho deu um passo à frente, e a voz de Lúcio Malfoy falou por baixo da máscara.
— Meu amo, é grande o nosso desejo de saber... suplicamos que nos conte... como foi que o senhor conseguiu este... milagre... como conseguiu voltar para nós...
— Ah, que história extraordinária, Lúcio! — disse Voldemort — E ela começa... e termina... com o meu jovem amigo aqui.
Ele caminhou descansadamente e parou ao lado de Harry, fazendo com que os olhos de todo o círculo se voltassem para os dois.
A cobra continuava a rastejar em círculos.
— Vocês sabem, naturalmente, que muitos chamam este garoto de minha perdição! — disse Voldemort baixinho, os olhos fixos em Harry, cuja cicatriz começou a arder tão ferozmente que ele quase gritou de agonia — Vocês todos sabem que na noite em que perdi meus poderes e o meu corpo, tentei matá-lo. A mãe dele morreu, tentando salvá-lo, e, sem saber, o resguardou com uma proteção que, devo admitir, eu não havia previsto... eu não pude tocar no rapaz.
Voldemort ergueu um longo dedo branco e levou-o até próximo do rosto de Harry.
— A mãe deixou nele os vestígios do seu sacrifício... isto é magia antiga, de que eu devia ter me lembrado, foi uma tolice tê-la esquecido... mas isso não importa. Eu agora posso tocá-lo.
Harry sentiu a ponta fria do longo dedo branco tocá-lo, e pensou que sua cabeça ia explodir de dor. Voldemort riu de mansinho na orelha do garoto, depois afastou o dedo e continuou a se dirigir aos Comensais da Morte.
— Eu calculei mal, meus amigos, admito. Minha maldição foi refratada pelo tolo sacrifício da mulher e ricocheteou contra mim. Ah... a dor que ultrapassa a dor, meus amigos, nada poderia ter me preparado para aquilo. Fui arrancado do meu corpo, me tornei menos que um espírito, menos que o fantasma mais insignificante... mas, ainda assim, continuei vivo. Em que me transformei, nem eu mesmo sei... eu que cheguei mais longe do que qualquer outro no caminho que leva à imortalidade. Vocês conhecem o meu objetivo, vencer a morte. E agora fui testado, e aparentemente uma, ou mais de uma, das minhas experiências foi bem sucedida... pois eu não morri, embora a maldição devesse ter me matado. Contudo, fiquei tão impotente quanto a mais fraca criatura viva e sem meios de ajudar a mim mesmo... pois não possuía mais corpo, e qualquer feitiço que pudesse ter me ajudado exigia o uso da varinha... só me lembro de me obrigar, sem dormir, sem cessar, segundo a segundo, a existir... fui morar em um lugar distante, numa floresta e esperei... certamente um dos meus fiéis Comensais da Morte tentaria me encontrar... um deles viria e realizaria por mim a mágica necessária para eu recuperar meu corpo... mas esperei em vão...
O arrepio tornou a perpassar o círculo de atentos Comensais da Morte.
Voldemort deixou o silêncio espiralar de modo terrível antes de prosseguir:
— Só me restara um poder. Eu podia me apossar do corpo de outros. Mas eu não me atrevia a ir aonde viviam muitos humanos, pois eu sabia que os aurores continuavam a viajar pelo exterior à minha procura. Por vezes eu habitava animais, as cobras, é claro, eram minhas preferidas, mas eu não ficava muito melhor dentro delas do que como puro espírito, porque seus corpos eram mal equipados para realizar mágicas... e apossar-me delas encurtava suas vidas, nenhuma delas sobreviveu muito tempo... então... há quatro anos... os meios para o meu retorno me pareceram garantidos. Um bruxo, jovem, tolo e crédulo, cruzou o meu caminho na floresta em que eu vivia. Ah, ele parecia exatamente a chance com que eu sonhara... porque era professor na escola de Dumbledore... era dócil à minha vontade... e me trouxe de volta a este país e, pouco depois, me apoderei do seu corpo para vigiá-lo de perto enquanto cumpria minhas ordens. Mas meu plano fracassou. Não consegui roubar a Pedra Filosofal. Não pude obter a vida eterna. Fui impedido... fui impedido, mais uma vez, por Harry Potter...
Novamente o silêncio, nada se movia, nem mesmo as folhas do teixo. Os Comensais da Morte permaneceram muito quietos, os olhos cintilantes em suas máscaras fixos em Voldemort e Harry.
— Meu servo morreu quando abandonei seu corpo, e fiquei mais fraco do que jamais estive. Voltei ao meu esconderijo distante, e não vou fingir que não receei então que talvez jamais recuperasse meus poderes... sim, aquela talvez tenha sido a hora mais negra da minha vida... eu não poderia esperar que caísse do céu outro bruxo para eu me apoderar... e já perdera as esperanças de que algum Comensal da Morte se importasse com o que me acontecera...
Uns dois bruxos mascarados no círculo se mexeram constrangidos, mas Voldemort não lhes deu a menor atenção.
— Então, há menos de um ano, quando eu praticamente abandonara toda esperança, aconteceu... um servo voltou para mim, o Rabicho aqui, que simulara a própria morte para fugir à justiça, foi forçado a se expor por aqueles que no passado tinham sido seus amigos, e resolveu voltar para o seu amo. Ele me procurou no campo onde houvera boatos de que eu estaria escondido... ajudado, naturalmente, pelos ratos que encontrou em seu caminho. Rabicho tem uma curiosa afinidade por ratos, não é mesmo, Rabicho? Seus imundos amiguinhos lhe contaram que havia um lugar, no meio de uma floresta albanesa que eles evitavam, onde pequenos animais como eles encontravam a morte pelas mãos de um vulto escuro que os possuía... mas a viagem de regresso não correu tranqüilamente para mim, não é, Rabicho?
“Certa noite, esfomeado, na orla da floresta em que esperava me encontrar, ele parou, tolamente, em uma estalagem para comer alguma coisa... e quem ele haveria de encontrar lá, se não Berta Jorkins, uma bruxa do Ministério da Magia? Agora vejam como o destino favorece Lorde Voldemort. Isto poderia ter sido o fim de Rabicho e da minha última chance de regeneração. Mas Rabicho, revelando uma presença de espírito que eu jamais esperaria dele, convenceu Berta Jorkins a acompanhá-lo em um passeio noturno. Ele a dominou... e a trouxe até mim. E Berta Jorkins, que poderia ter posto tudo a perder, em vez disso provou ser uma dádiva que superou as minhas expectativas mais extravagantes... pois, com um nadinha de persuasão, tornou-se uma verdadeira mina de informações. Ela me contou que este ano seria realizado um Torneio Tribruxo em Hogwarts. E que conhecia um Comensal da Morte fiel que teria muito prazer em me ajudar, se eu o procurasse. Ela me contou muitas coisas... mas os meios que usei para romper o Feitiço da Memória que a dominava foram fortes, e depois que extrai dela toda informação útil, sua mente e seu corpo ficaram irrecuperavelmente danificados. Servira a sua finalidade. Mas eu não poderia me apossar do seu corpo. Descartei-a.”
Voldemort sorriu, aquele sorriso medonho, seus olhos vermelhos vidrados e cruéis.
— O corpo de Rabicho, naturalmente, era pouco próprio para uma possessão, já que todos o presumiam morto e ele atrairia demasiada atenção se fosse visto. Contudo, era o servo fisicamente válido de que eu precisava. E, embora fosse um bruxo medíocre, foi capaz de seguir as instruções que lhe dei e que me devolveriam um corpo rudimentar e fraco, porém meu, um corpo que eu poderia habitar enquanto esperava os ingredientes essenciais para uma verdadeira ressurreição... uns feitiços de minha própria invenção... uma ajudazinha de Nagini
Os olhos de Voldemort se voltaram para a cobra que circulava a lápide sem parar.
— Uma poção feita com sangue de unicórnio, veneno de cobra fornecido por Nagini... e logo eu recuperei uma forma quase humana e suficientemente forte para viajar. Não havia mais esperanças de roubar a Pedra Filosofal, pois eu sabia que Dumbledore teria tomado providências para destruí-la. Mas eu estava disposto a abraçar mais uma vez a vida mortal antes de perseguir a imortal. Estabeleci objetivos mais modestos... aceitei ter o meu antigo corpo e a minha antiga força de volta. Eu sabia que para obter isso, que é uma velha peça de Magia Negra a poção que me reanimou hoje à noite, eu precisaria de três poderosos ingredientes. Bem, um deles já estava à mão, não é mesmo, Rabicho? A carne doada por um servo... o osso do meu pai, naturalmente, significava que eu teria que vir até aqui, onde ele estava enterrado. Mas o sangue de um inimigo...
“Rabicho queria que eu usasse um bruxo qualquer, não foi, Rabicho? Um bruxo qualquer que tivesse me odiado... como tantos ainda odeiam. Mas eu sabia do que precisava, se era para me reerguer mais poderoso do que tinha sido antes da queda. Eu queria o sangue de Harry Potter. Eu queria o sangue daquele que tinha me despojado do poder há treze anos, porque a proteção duradoura que a mãe dele tinha lhe dado circularia em minhas veias também... mas como apanhar Harry Potter? Porque ele foi protegido muito mais do que acho que ele sabe, protegido de várias maneiras criadas por Dumbledore há muito tempo, quando recebeu o encargo de cuidar do futuro do garoto. Dumbledore invocou uma mágica antiga para garantir a proteção ao garoto enquanto estivesse aos cuidados dos parentes. Nem mesmo eu posso tocá-lo em casa deles... depois, naturalmente houve a Copa Mundial de Quadribol... achei que a proteção dele enfraqueceria ali, longe dos parentes e de Dumbledore, mas eu ainda não estava suficientemente forte para tentar seqüestrá-lo em meio a uma horda de bruxos do Ministério. Depois, o garoto retornaria a Hogwarts, onde vive debaixo do nariz torto daquele tolo, amante de trouxas, de manhã à noite.
“Então, como poderia capturá-lo? Ora... aproveitando as informações de Berta Jorkins, é claro. Usando o meu fiel Comensal da Morte, baseado em Hogwarts, para garantir que o nome do garoto fosse inscrito no Cálice de Fogo. Usando o meu Comensal da Morte para garantir que o garoto ganhasse o torneio, que tocasse a Taça Tribruxo primeiro, Taça que o meu Comensal da Morte havia transformado em uma Chave de Portal para trazê-lo aqui, longe do socorro e proteção de Dumbledore, até o aconchego dos meus braços abertos para recebê-lo. E aqui está ele... o garoto que vocês todos acreditaram que tinha sido minha ruína...”
Voldemort avançou lentamente e se virou para encarar Harry. Ergueu a varinha.
Crucio!
Foi uma dor que superou qualquer coisa que Harry já sofrera, seus próprios ossos pareciam estar em fogo, sua cabeça, sem dúvida alguma, estava rachando ao longo da cicatriz, seus olhos giravam descontrolados em sua cabeça, ele queria que tudo terminasse... que perdesse os sentidos... morresse...
Então passou. Ele ficou pendurado nas cordas que o prendiam à lápide do pai de Voldemort, olhando aqueles brilhantes olhos vermelhos através de uma espécie de névoa. A noite ressoava com o estrépito das risadas dos Comensais da Morte.
— Estão vendo a tolice que foi vocês suporem que este garoto algum dia pudesse ser mais forte que eu? — ponderou Voldemort — Mas eu não quero que reste nenhum engano na mente de ninguém. Harry Potter me escapou por pura sorte. E vou provar o meu poder matando-o, aqui e agora, diante de todos vocês, onde não há Dumbledore para ajudá-lo nem mãe para morrer por ele. Vou dar a Harry uma oportunidade. Ele poderá lutar, e vocês não terão mais dúvida alguma sobre qual de nós é mais forte. Espere mais um pouquinho Nagini.
Sussurrou ele, e a cobra se afastou, deslizando pelo capim, até o local em que os Comensais da Morte estavam parados observando.
— Agora, desamarre-o Rabicho, e devolva sua varinha.









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