quarta-feira, 14 de setembro de 2011

O Conde de Monte Cristo - Capítulo 74



LXXIV

O JAZIGO DA FAMÍLIA VILLEFORT




D
ois dias mais tarde, por volta das dez horas da manhã, encontrava-se reunida uma multidão considerável à porta do Sr. de Villefort, para ver passar uma longa fila de carros fúnebres e carruagens particulares ao longo do Arrabalde de Saint-Honoré e da Rua da Pépiniere. Entre essas carruagens havia uma de forma singular e que parecia ter feito longa viagem. Era uma espécie de furgão pintado de preto e fora dos primeiros a comparecer ao fúnebre encontro. Os curiosos tinham-se informado e haviam sabido que, devido a uma coincidência estranha, aquele carro encerrava o corpo do Sr. Marquês de Saint-Méran e que, portanto, aqueles que tinham vindo para acompanhar um só cadáver acompanhariam dois.
Preveniram-se imediatamente as autoridades e conseguiu-se que os dois funerais se realizassem ao mesmo tempo. Uma segunda viatura adornada com a mesma pompa funerária da primeira foi trazida para diante da porta do Sr. de Villefort e a urna transportada no furgão de posta transferida para a carruagem fúnebre.
Os dois corpos deviam ser inumados no Cemitério do Pére-Lachaise, onde havia muito tempo o Sr. de Villefort mandara erguer o jazigo destinado a sepultar toda a sua família. No jazigo fora já depositado o corpo da pobre Renée, a quem o pai e mãe se vinham juntar depois de dez anos de separação.
Paris, sempre curiosa, sempre comovida com as pompas fúnebres, viu passar em religioso silêncio o cortejo esplêndido que acompanhava à sua última morada dois dos mais célebres nomes da velha aristocracia, pelo seu espírito tradicional, pela firmeza das suas convicções e pela dedicação obstinada aos príncipes.
Beauchamp, Albert e Château-Renaud, que seguiam na mesma carruagem, trocavam impressões acerca daquela morte quase súbita.
— Vi a Sra. de Saint-Méran ainda o ano passado, em Marselha, no meu regresso da Argélia — dizia Château-Renaud — Parecia uma mulher destinada a viver cem anos, graças à sua perfeita saúde, ao seu espírito sempre atento e à sua atividade sempre prodigiosa. Que idade tinha ela?
— Sessenta e seis — respondeu Albert — Pelo menos foi o que Franz me disse. Mas não foi a idade que a matou, foi o desgosto que lhe causou a morte do Marquês. Parece que depois dessa morte, que a abalou violentamente, ela nunca mais recuperou por completo a razão.
— Mas enfim, de que morreu? — perguntou Beauchamp.
— De uma congestão cerebral, parece, ou de uma apoplexia fulminante. Não é a mesma coisa?
— Mais ou menos.
— De apoplexia? — repetiu Beauchamp — É difícil de acreditar. A Sra. de Saint-Méran, que também vi uma vez ou duas na minha vida, era baixinha, frágil e de constituição muito mais nervosa do que sanguínea. São raras as apoplexias produzidas pelo desgosto em corpos de constituição idêntica ao da Sra. de Saint-Méran.
— Em todo o caso — observou Albert — Qualquer que tenha sido a doença ou o médico que a matou, aí estão o Sr. de Villefort, ou Mademoiselle Valentine, ou ainda o nosso amigo Franz, de posse de uma magnífica herança: oitenta mil libras de rendimento, parece-me.
— Herança que quase duplicar por morte do velho jacobino Noirtier.
— Aí está um avô resistente — observou Beauchamp. — Tenacem propositi virum. Apostou com a morte, creio, que enterraria todos os seus herdeiros. E o conseguirá, estou certo. É bem o velho convencional de 93 que dizia a Napoleão em 1814: “Declinais porque o vosso império é um jovem caule cansado pelo seu crescimento. Tomais a República como tutor, regressemos com uma boa constituição aos campos de batalha e prometo-vos quinhentos mil soldados, outro Marengo e segundo Austerlitz. As idéias não morrem, Sir, dormitam às vezes, mas acordam mais fortes do que antes de adormecer”.
— Parece que para ele os homens são como as idéias — disse Albert — Apenas uma coisa me preocupa: saber como Franz d’Epinay se entenderá com o avô da sua futura mulher, visto o velho não poder passar sem ela. Mas onde está Franz?
— Na primeira carruagem, com o Sr. de Villefort, que o considera já como se fosse da família.
Em todas as carruagens que acompanhavam o funeral a conversa era pouco mais ou menos a mesma. As pessoas admiravam-se com aquelas duas mortes tão próximas e tão rápidas, mas nenhuma suspeitava do terrível segredo que no seu passeio noturno o Sr. de Avrigny revelara ao Sr. de Villefort.
Ao fim de cerca de uma hora de marcha, o préstito chegou à porta do cemitério. O tempo estava calmo, mas sombrio, portanto muito de harmonia com a fúnebre cerimônia que estava se realizando. Entre os grupos que se dirigiram para o jazigo de família, Château-Renaud reconheceu Morrel, que viera sozinho e de cabriolé. Caminhava isolado, muito pálido e silencioso, pelo carreiro orlado de teixos.
— Você aqui? — perguntou Château-Renaud, passando o braço pelo do jovem capitão — Quer dizer que conhece o Sr. de Villefort? Como isso é possível se nunca o vi na casa dele?
— Não conheço, o Sr. de Villefort — respondeu Morrel — Quem eu conhecia era a Sra. de Saint-Méran.
Neste momento, Albert juntou-se com Franz.
— O lugar é mal escolhido para uma apresentação — disse Albert — Mas não importa, não somos supersticiosos. Sr. Morrel, permita que lhe apresente o Sr. Franz d’Epinay, um excelente companheiro de viagem, com o qual percorri a Itália. Meu caro Franz, o Sr. Maximilien Morrel, um excelente amigo que adquiri na sua ausência e cujo nome me ouvirá citar todas as vezes que falar de coração, de espírito e de amabilidade.
Morrel teve um momento de indecisão e perguntou a si mesmo se não seria uma condenável hipocrisia saudar quase amigavelmente o homem que combatia em segredo. Mas o seu juramento e a gravidade das circunstâncias vieram-lhe à memória. Esforçou-se por não deixar transparecer nada no rosto, conteve-se e cumprimentou Franz.
— Mademoiselle de Villefort está muito triste, não é verdade? — perguntou Debray a Franz.
— Oh, de uma tristeza inexplicável, senhor! — respondeu Franz — Esta manhã estava tão desfigurada que mal a reconheci.
Estas palavras aparentemente tão simples feriram o coração de Morrel. Aquele homem vira Valentine e falara-lhe... foi então que o jovem e impetuoso oficial necessitou de toda a sua energia para resistir ao desejo de violar o seu juramento. Pegou no braço de Château-Renaud e arrastou-o rapidamente para o jazigo, diante do qual os empregados da agência funerária acabavam de depositar as duas urnas.
— Magnífica habitação — comentou Beauchamp, admirando o mausoléu — Palácio de Verão e Palácio de Inverno. Nele residirá um dia, meu caro Epinay, porque em breve também será da família. Eu, na minha qualidade de filósofo prefiro uma casinha de campo, um chalé à sombra das árvores, e menos pedras trabalhadas sobre o meu pobre corpo. Quando morrer, direi aos que me rodearem o que Voltaire escrevia a Piron: E o rus e tudo estará acabado... vamos, caramba! Franz, coragem, a sua mulher herda.
— Na verdade, Beauchamp, você é insuportável — perguntou Franz — A política habituou-o a rir de tudo e os homens que a dirigem têm o hábito de não acreditar em nada. Mas enfim, Beauchamp, quando tenha a honra de se encontrar entre homens vulgares e a sorte de se afastar por instantes da política, procure trazer consigo o coração em vez de o deixar no bengaleiro da Câmara dos Deputados ou da Câmara dos Pares.
— Mas, meu Deus, que é a vida? — perguntou Beauchamp — Uma paragem na antecâmara da morte.
— Não estou gostando nada da conversa de Beauchamp — disse Albert.
E recuou quatro passos com Franz, deixando Beauchamp continuar as suas dissertações filosóficas com Debray.
O jazigo da família Villefort formava um quadrado de pedra branca de cerca de vinte pés de altura. Uma separação interior dividia em dois compartimentos a família Saint-Méran e a família Villefort, e cada compartimento tinha a sua porta de entrada.
Não se via, como nos outros jazigos, essas ignóbeis prateleiras sobrepostas, em que uma distribuição econômica encerra os mortos com uma inscrição que mais parece uma etiqueta. Tudo o que de início se via através da porta de bronze era uma antecâmara severa e escura, separada por uma parede do túmulo propriamente dito.
Era no meio dessa parede que se abriam as duas portas de que falamos há pouco e que comunicavam com as sepulturas Villefort e Saint-Méran.
Ali podia-se dar livre curso à dor sem que os passeantes despreocupados, que fazem de uma visita ao Pére-Lachaise um passeio ao campo ou um encontro amoroso, perturbassem com os seus cantos, os seus gritos ou as suas correrias a muda contemplação ou a prece banhada de lágrimas do visitante do jazigo.
As duas urnas entraram no jazigo da direita, o da família Saint-Méran, e foram colocadas em cima de cavaletes já preparados antecipadamente e que só esperavam o seu depósito mortal. Villefort, Franz e mais alguns parentes próximos penetraram sozinhos no santuário.
Como as cerimônias religiosas tinham sido efetuadas à porta e não havia discursos a pronunciar, os acompanhantes retiraram-se imediatamente. Château-Renaud, Albert e Morrel foram por um lado e Debray e Beauchamp por outro.
Franz ficou sozinho com o Sr. de Villefort à porta do cemitério. Morrel deteve-se sob qualquer pretexto. Viu sair Franz e o Sr. de Villefort numa carruagem e teve um mau presságio daquela conversa íntima. Por fim, regressou a Paris na mesma carruagem em que vinham Château-Renaud e Albert, mas não ouviu nem uma palavra do que disseram os dois rapazes. Com efeito, no momento em que Franz se ia separar do Sr. de Villefort, este perguntara-lhe:
— Sr. Barão, quando o tornarei a ver?
— Quando quiser, senhor — respondera Franz.
— O mais cedo possível.
— Estou às suas ordens, senhor. Quer que regressemos juntos?
— Se isso lhe não causa nenhum transtorno...
— Nenhum.
Foi assim que o futuro sogro e o futuro genro subiram para a mesma carruagem e que Morrel, ao vê-los passar, concebeu com razão graves preocupações. Villefort, e Franz regressaram ao Arrabalde de Saint-Honoré.
Sem ver ninguém, nem falar à mulher e à filha, o Procurador Régio levou o jovem para o seu gabinete, indicou-lhe uma cadeira e disse-lhe:
— Senhor d’Epinay, devo recordar-lhe, e o momento não é talvez tão mal escolhido como se poderá crer à primeira vista, porque a obediência aos mortos é a primeira oferenda que se deve depositar sobre o caixão, devo, portanto lembrar-lhe o desejo manifestado anteontem pela Sra. de Saint-Méran no seu leito de morte, isto é, que o casamento de Valentine não fosse adiado. Como sabe, os assuntos da defunta estão perfeitamente em ordem e o seu testamento assegura a Valentine toda a fortuna dos Saint-Méran. O tabelião mostrou-me ontem as minutas que permitem redigir definitivamente o contrato de casamento. Pode procurar o tabelião e pedir-lhe da minha parte que lhe mostre as minutas. O tabelião é o Sr. Deschamps, Praça Beauvau é Arrabalde de Saint-Honoré.
— Senhor — respondeu Epinay — Este talvez não seja o momento indicado para Mademoiselle Valentine, mergulhada como está na sua dor, pensar num marido. Na verdade, recearia...
— Valentine — interrompeu-o o Sr. de Villefort — Não terá mais vivo desejo do que cumprir as últimas vontades da avó. Portanto, os obstáculos não virão desse lado, garanto-lhe.
— Nesse caso, senhor — respondeu Franz — Como também não virão do meu, pode fazer o que entender. Dei a minha palavra e a cumprirei não só com prazer, mas também com felicidade.
— Nesse caso, nada nos detém — disse Villefort — O contrato deveria ter sido assinado há três dias e, portanto encontraremos tudo preparado. Podemos assiná-lo hoje mesmo.
— E o luto? — lembrou Franz, hesitante.
— Sossegue, senhor — prosseguiu Villefort — Não é hábito em minha casa descuidar das conveniências. Mademoiselle de Villefort poderá retirar-se durante os três meses da praxe para a sua propriedade de Saint-Méran. Digo a sua propriedade, porque lhe pertence. Aí, dentro de oito dias, se achar bem, sem barulho, sem dar nas vistas, sem fausto, se celebrará o casamento naquela propriedade. Concluído o casamento, o senhor pode regressar a Paris, enquanto a sua mulher passará o tempo de luto com a madrasta.
— Como lhe aprouver, senhor — disse Franz.
— Então, queira ter o incômodo de esperar cerca de meia-hora — prosseguiu Villefort — Valentine vai descer à sala. Mandarei buscar o Sr. Deschamps, leremos e assinaremos o contrato imediatamente e ainda esta tarde a Sra. de Villefort, acompanhará Valentine à sua propriedade, onde daqui a oito dias iremos ter com elas.
— Tenho apenas um pedido a fazer-lhe, senhor — disse Franz.
— Qual?
— Desejo que Albert de Morcerf e Raul de Château-Renaud estejam presentes a essa assinatura. Como sabe, são minhas testemunhas.
— Meia-hora basta para os avisar. Quer ir buscá-los pessoalmente ou deseja mandar chamá-los?
— Prefiro ir, senhor.
— Esperarei, portanto dentro de meia-hora, barão, e dentro de meia-hora também Valentine estará pronta.
Franz cumprimentou o Sr. de Villefort a saiu.
Assim que a porta da rua se fechou atrás do jovem, Villefort mandou prevenir Valentine de que deveria descer à sala dentro de meia-hora, altura em que se esperava a chegada do tabelião e das testemunhas do Sr. d’Epinay.
Esta notícia inesperada produziu grande sensação na casa. A Sra. de Villefort nem queria acreditar e Valentine ficou como que fulminada. Olhou à sua volta, como se procurasse a quem pedir socorro. Quis descer aos aposentos do avô, mas encontrou na escada o Sr. de Villefort, que a agarrou por um braço e a levou para a sala. Na antecâmara, Valentine encontrou Barrois e deitou ao velho criado um olhar desesperado.
Pouco depois de Valentine entrou na sala a Sra. de Villefort com o pequeno Edouard. Era visível que a jovem senhora tivera o seu quinhão nos desgostos da família; estava pálida e parecia horrivelmente fatigada. Sentou-se, pegou Edouard no colo e de vez em quando apertava-o ao peito, com gestos quase convulsos, aquela criança em que toda a sua vida parecia concentrada.
Não tardou a ouvir-se o ruído de duas carruagens que entravam no pátio. Uma era a do tabelião e a outra a de Franz e dos seus amigos. Num instante, todos se reuniram na sala.
Valentine estava tão pálida que se viam as veias azuladas das têmporas desenharem-se à roda dos olhos e correrem-lhe ao longo das faces.
Franz não conseguia disfarçar uma emoção bastante viva. Château-Renaud e Albert entreolharam-se surpreendidos: a cerimônia que pouco antes terminara não lhes parecera menos triste do que a que ia começar.
A Sra. de Villefort colocara-se na sombra, atrás do reposteiro de veludo, e como estava constantemente inclinada para o filho, era difícil ler no seu rosto o que lhe ia na alma.
O Sr. de Villefort estava, como sempre, impassível.
Depois de ter, com o método peculiar dos funcionários da justiça, alinhado os papéis em cima da mesa, tomado lugar na sua poltrona e tirado os óculos, o tabelião virou-se para Franz.
— É o Sr. Franz de Quesnel, Barão d’Epinay? — perguntou, embora o soubesse perfeitamente.
— Sim, senhor — respondeu Franz.
O tabelião inclinou-se.
— Devo portanto preveni-lo, senhor, da parte do Sr. de Villefort, que o seu casamento com Mademoiselle de Villefort modificou as disposições do Sr. de Noirtier para com a neta e que ele alienou inteiramente a fortuna que lhe devia transmitir. Apressamo-nos a acrescentar — continuou o tabelião — Que, como o testador não tinha o direito de alienar senão uma parte da sua fortuna e a alienou toda, o testamento não resistirá à sua contestação e será declarado nulo e sem nenhum efeito.
— É verdade — declarou Villefort — No entanto, desde já o previno o Sr. d’Epinay que enquanto eu for vivo nunca o testamento do meu pai será contestado, pois a minha posição proíbe-me até a sombra de um escândalo.
— Senhor — disse Franz — Penaliza-me que se tenha suscitado semelhante questão na presença de Mademoiselle Valentine. Nunca me informei do montante da sua fortuna, que, por mais reduzida que seja, será sempre mais considerável do que a minha. O que a minha família procurou na aliança com o Sr. de Villefort foi a consideração; o que eu procuro é a felicidade.
Valentine fez um imperceptível sinal de agradecimento, enquanto duas lágrimas silenciosas lhe corriam ao longo das faces.
— De resto, senhor — acrescentou Villefort, dirigindo-se ao seu futuro genro — Excetuando a perda de parte das suas esperanças, esse testamento inesperado não tem nada que pessoalmente o possa melindrar; ele explica-se pela fraqueza de espírito do Sr. Noirtier. O que desagrada a meu pai, não é que Mademoiselle de Villefort se torne baronesa d’Epinay, é que Valentine se case. Uma união com qualquer outro lhe causaria o mesmo desgosto. A velhice é egoísta, senhor, e Mademoiselle de Villefort fazia ao Sr. de Noirtier uma assídua companhia que lhe não poderá fazer a Sra. Baronesa d’Epinay. O triste estado em que se encontra meu pai contribui para que raramente lhe falemos de assuntos sérios, que a fraqueza do seu espírito lhe não permitiria acompanhar, e estou absolutamente convencido de que neste momento, embora conservando a lembrança de que a neta se casa, o Sr. Noirtier até já esqueceu o nome daquele que vai ser seu neto.
Mal o Sr. de Villefort acabara de proferir estas palavras, às quais Franz respondia com uma inclinação, a porta da sala abriu-se e apareceu Barrois.
— Senhores — disse uma voz estranhamente firme, para um criado que se dirige a seus amos numa circunstância tão solene — Senhores, o Sr. Noirtier de Villefort deseja falar imediatamente com o Sr. Franz de Quesnel, Barão d’Epinay.
Também ele, como o tabelião, e a fim de não poder haver erro de pessoa, dava todos os títulos ao noivo.
Villefort estremeceu, a Sra. de Villefort deixou escorregar o filho do colo e Valentine ergueu-se, pálida e muda como uma estátua. Albert e Château-Renaud trocaram segundo olhar, mais atônito ainda do que o primeiro.
O tabelião olhou para Villefort.
— É impossível — disse o Procurador Régio — De resto, o Sr. d’Epinay não pode sair da sala neste momento.
— É precisamente neste momento — perguntou Barrois com a mesma firmeza — Que o Sr. Noirtier, meu amo, deseja falar de assuntos importantes com o Sr. Franz d’Epinay.
— Então o avô Noirtier já fala? — perguntou Edouard, com a sua impertinência habitual.
Mas esta gracinha nem sequer fez sorrir a Sra. de Villefort, de tal modo os espíritos se encontravam preocupados, de tal modo a situação parecia solene.
— Diga ao Sr. Noirtier — respondeu Villefort — Que o seu pedido não pode ser satisfeito.
— Então, o Sr. Noirtier previne Vossa Excelência de que se vai fazer transportar ele próprio para a sala — replicou Barrois.
O espanto atingiu o cúmulo. Uma espécie de sorriso desenhou-se no rosto da Sra. de Villefort, e Valentine, como que a seu pesar, levantou os olhos para o teto a fim de agradecer ao Céu.
— Valentine — disse o Sr. de Villefort — Vá num instante saber, peço-lhe, que novo capricho é esse do seu avô.
Valentine deu vivamente alguns passos para sair, mas o Sr. de Villefort mudou de idéia.
— Espere, acompanho-a.
— Perdão, senhor — interveio Franz — Mas parece-me, uma vez que foi a mim que o Sr. Noirtier mandou chamar, que é, sobretudo a mim que compete satisfazer os seus desejos. Aliás, terei muito prazer em lhe apresentar os meus respeitos, visto não ter tido ainda ensejo de solicitar essa honra.
— Meu Deus, não vale a pena incomodar-se! — insistiu Villefort, visivelmente inquieto.
— Desculpe, senhor — perguntou Franz, no tom de um homem que tomou a sua resolução — Mas não desejo perder a oportunidade de provar ao Sr. Noirtier como faria mal em conceber contra mim repugnâncias que estou decidido a vencer, sejam quais forem, com a minha profunda dedicação.
E sem se deixar reter mais tempo por Villefort, Franz levantou-se por seu turno e seguiu Valentine, que já descia a escada com a alegria de um náufrago que se agarra a uma rocha. O Sr. de Villefort seguiu-os. Château-Renaud e Morcerf trocaram terceiro olhar, ainda mais atônito do que os dois primeiros.





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