sexta-feira, 2 de setembro de 2011

O Conde de Monte Cristo - Capítulo 66


 LXVI

PROJETOS DE CASAMENTO




N
o dia seguinte ao desta cena, à hora que Debray costumava escolher para, antes de ir para o seu gabinete, fazer uma visitinha à Sra. Danglars, o seu cupé não apareceu no pátio. A essa hora, isto é, por volta do meio-dia e meia hora, a Sra. Danglars pediu a sua carruagem e saiu. Danglars, colocado atrás de uma cortina, espreitara aquela saída, que esperava, e ordenou que o prevenissem imediatamente quando a senhora voltasse. Mas às duas horas ela ainda não tinha regressado. Às duas horas, Danglars pediu os seus cavalos, dirigiu-se para a Câmara e inscreveu-se para falar contra o orçamento.
Do meio-dia às duas horas, Danglars permanecera no seu gabinete lendo a sua correspondência com ar cada vez mais sombrio e a alinhar números sobre números, além de receber, entre outras, a visita do Major Cavalcanti, que, sempre lívido, hirto e pontual, se apresentou à hora anunciada na véspera para concluir o seu negócio com o banqueiro.
Quando saiu da Câmara, Danglars, que dera sinais evidentes de agitação durante a sessão e que, sobretudo fora mais acerbo do que nunca contra o ministério, meteu-se na sua carruagem e ordenou ao cocheiro que o conduzisse à Avenida Champs-Élysées, nº. 30.
Monte Cristo estava em casa; mas como estava com alguém, pedia a Danglars que esperasse um instante na sala. Enquanto o banqueiro esperava, a porta abriu-se e ele viu entrar um homem vestido de abade, que, em vez de esperar como ele, o cumprimentou e, decerto por ser mais familiar do que ele na casa, se dirigiu para o interior desta e desapareceu. Pouco depois, a porta por onde entrara o padre voltou a abrir-se e Monte Cristo apareceu.
— Desculpe, meu caro barão — disse — Mas um dos meus melhores amigos, o Abade Busoni, que deve ter visto passar, acaba de chegar a Paris. Havia muito tempo que não nos víamos e não tive coragem de o deixar imediatamente. Espero que, atendendo ao motivo, me desculpe tê-lo feito esperar.
— Ora essa, eu é que escolhi mal o momento. Mas o remédio‚ simples: retiro-me.
— De modo nenhum, Pelo contrário, faça favor de se sentar. Mas, meu Deus, que tem o senhor? Tem o ar de estar muito preocupado. Na verdade, assusta-me. Um capitalista preocupado é como os cometas: pressagia sempre alguma grande desgraça no mundo.
— Meu caro senhor — respondeu Danglars — Há vários dias que a pouca sorte me persegue e que só recebo más noticias.
— Meu Deus, voltou a perder na Bolsa? — perguntou Monte Cristo.
— Não, disso já me ressarci, pelo menos por alguns dias. Trata-se muito simplesmente para mim de uma falência em Trieste.
— Sim? E o seu falido será por acaso Jacopo Manfredi?
— Exatamente! Imagine um homem que tinha comigo, há não sei quanto tempo, negócios no montante de oitocentos ou novecentos mil francos por ano. Nunca um erro de contas, nunca um atraso. Um figurão que pagava como um príncipe... dos que pagam. Adiantei-lhe um milhão e o diabo do meu Jacopo Manfredi suspende pagamentos!
— Deveras?
— Uma fatalidade inaudita. Saco sobre ele seiscentas mil libras e o papel vem-me devolvido, não cobrado, e, além disso sou ainda portador de quatrocentos mil francos de letras aceites por ele e pagáveis no fim deste mês no seu correspondente em Paris. Estamos a 30, mandei receber. Pois sim, o correspondente desapareceu! Juntamente com o meu negócio de Espanha, tenho um bonito fim de mês.
— Mas foi realmente uma perda o seu negócio de Espanha?
— Claro, setecentos mil francos fora do meu cofre, apenas isso!
— Como diabo cometeu semelhante asneira, o senhor, um velho especulador?
— A culpa foi da minha mulher. Sonhou que D. Carlos regressara a Espanha. Ela acredita nos sonhos. Trata-se de magnetismo, diz ela, e quando sonha uma coisa, essa coisa, ao que afirma, tem infalivelmente de acontecer. Dada a sua convicção, deixo-a jogar. Ela tem o seu pé-de-meia, e o seu corretor. Joga e perde. E certo que se não trata do meu dinheiro e sim do seu, mas mesmo assim o caso interessa-me. Compreende, quando da bolsa da mulher saem setecentos mil francos, o marido acaba sempre por descobrir. Como, não sabia de nada? Pois olhe que o caso deu muito que falar.
— Efetivamente ouvi qualquer coisa a esse respeito, mas ignorava os pormenores, pois não há ninguém mais ignorante desses negócios de Bolsa do que eu.
— O senhor não joga?
— Eu? Como queria que jogasse? Tenho já tanta dificuldade em cuidar dos meus rendimentos que, além do meu intendente, seria obrigado a contratar um escriturário e um caixa. Mas a propósito da Espanha, parece-me que a baronesa não sonhou completamente com a história do regresso de D. Carlos. Os jornais não disseram qualquer coisa a esse respeito?
— E o senhor acredita nos jornais?
— Absolutamente nada. Mas parece-me que esse honesto Messager era uma exceção à regra e só anunciava as notícias verdadeiras, as notícias telegráficas.
— Pois isso mesmo é que é inexplicável — perguntou Danglars — O regresso de D. Carlos era efetivamente uma notícia telegráfica.
— De modo que o senhor perdeu este mês um milhão e setecentos mil francos, pouco mais ou menos? — perguntou Monte Cristo.
— Não há pouco mais ou menos, foi exatamente essa verba.
— Demônio, para uma fortuna de terceira ordem, é um rude golpe! — declarou Monte Cristo, com compaixão.
— De terceira ordem? — repetiu Danglars um pouco vexado — Que diabo entende o senhor por isso?
— Sem dúvida — prosseguiu Monte Cristo — Divido as fortunas em três categorias: fortunas de primeira ordem, segunda ordem e terceira ordem. Chamo fortuna de primeira ordem à que se compõe de tesouros ao alcance da mão: terras, minas, títulos sobre Estados como a França, a Áustria e a Inglaterra, contanto que esses tesouros, essas minas e esses títulos atinjam o total de uma centena de milhões. Chamo fortuna de segunda ordem às explorações manufatureiras, às empresas por quotas, aos vice-reinos e aos principados que não excedam um milhão e quinhentos mil francos de rendimento e ao todo possuam um capital à volta de cinqüenta milhões. Finalmente, chamo fortuna de terceira ordem aos capitais que frutificam por meio de juros compostos, cujos ganhos dependem da vontade de outros ou dos caprichos do acaso, que uma falência desmorona, que uma notícia telegráfica abala; às especulações eventuais e, enfim, às operações submetidas aos acasos dessa fatalidade, que poderíamos chamar força menor comparando-a com a força maior, que é a força natural; tudo constituindo um capital fictício ou real dos seus quinze milhões. Não é pouco mais ou menos esta a sua situação, diga?
— Pois sim, é! — respondeu Danglars.
— O que significa que com seis fins de mês como este — continuou imperturbável Monte Cristo — Uma casa de terceira ordem estaria na agonia.
— Oh! — exclamou Danglars, com um sorriso muito pálido — Onde o senhor vai!...
— Digamos sete meses — replicou Monte Cristo, no mesmo tom — Já pensou alguma vez que sete vezes um milhão e setecentos mil francos fazem cerca de doze milhões?... Não? Claro, tem razão, pois com semelhantes reflexões nunca ninguém arriscaria os seus capitais, que são para o financeiro o que a pele é para o homem civilizado. Temos as nossas roupas, mais ou menos suntuosas, que são o nosso crédito. Mas quando o homem morre tem apenas a sua pele, tal como, se renunciasse aos negócios, o senhor só teria a sua fortuna real, cinco ou seis milhões quando muito. Porque as fortunas de terceira ordem quase só valem a terça ou a quarta parte do que aparentam, tal como a locomotiva de um comboio não passa quase sempre, no meio do fumo que a envolve e a faz parecer maior, de uma máquina mais ou menos forte. Pois bem, dos cinco milhões que constituem o seu ativo real, o senhor acaba de perder à volta de dois, que diminuem em igual quantia a sua fortuna fictícia ou o seu crédito. Quer dizer, meu caro Sr. Danglars! Precisa de dinheiro? Quer que lhe empreste?
— O senhor é um mau calculador! — protestou Danglars, chamando em seu auxílio toda a filosofia e toda a dissimulação da aparência — Neste momento o dinheiro já entrou nos meus cofres graças a outras especulações bem sucedidas. O sangue saído pela sangria voltou a entrar pela nutrição. Perdi uma batalha na Espanha e fui vencido em Trieste, mas a minha frota da Índia apresou com certeza alguns galeões e os meus pioneiros do México devem ter descoberto alguma mina.
— Ótimo, Ótimo! Mas a cicatriz ficará e ao primeiro prejuízo reabrirá...
— Não, porque me baseio em certezas — prosseguiu Danglars, com a loquacidade vulgar do charlatão que procura não deixar o seu crédito por mãos alheias — Para me derrubar seria preciso que três governos caíssem.
— Bom... já se tem visto.
— Que a terra não produzisse.
— Lembre-se das sete vacas gordas e das sete vacas magras.
— Ou que o mar se abrisse, como no tempo do Faraó. Mas há vários mares e os navios poderiam transformar-se em caravanas...
— Tanto melhor, mil vezes tanto melhor, caro Sr. Danglars — disse Monte Cristo — Verifico que me enganei e que o senhor pertence às fortunas de segunda ordem.
— Creio poder aspirar a essa honra — perguntou Danglars, com um daqueles sorrisos estereotipados que causavam a Monte Cristo o eleito de uma dessas luas pastosas com que os maus pintores pintalgam as suas ruínas — Mas já que estamos falando de negócios — acrescentou, encantado por encontrar pretexto para mudar de conversa — Diga-me mais ou menos o que posso fazer pelo Sr. Cavalcanti.
— Mas dar-lhe dinheiro, se ele tiver um crédito sobre o senhor e se esse crédito lhe parecer bom.
— Excelente! Apresentou-se esta manhã com uma ordem de quarenta mil francos, pagável à vista sobre o senhor, assinada por Busoni e endossada a mim por si. Como calcula, entreguei-lhe imediatamente os quarenta mil francos.
Monte Cristo fez um sinal de cabeça que indicava estar plenamente de acordo.
— Mas isto não é tudo — continuou Danglars — Abriu ao filho um crédito sobre mim.
— Quanto, se não é indiscrição, dá ele ao rapaz?
— Cinco mil francos por mês.
— Cinqüenta mil francos por ano. Já desconfiava disso — disse Monte Cristo, encolhendo os ombros — São uns forretas, esses Cavalcanti! Que quer ele que um rapaz faça com cinco mil francos por mês?
— Mas se o rapaz necessitar de mais alguns milhares de francos...
— Não caia nessa! O pai não os pagará. O senhor não conhece todos os milionários transalpinos; são autênticos sovinas. E por intermédio de quem lhe abriu o crédito?
— Por intermédio da Casa Fenzi, uma das melhores de Florença.
— Não quero dizer que o seu dinheiro não esteja seguro, nem por sombras; mas, mesmo assim, cinja-se aos termos da carta de crédito.
— Devo entender que no meu lugar não confiaria no Cavalcanti?
— Eu? Daria-lhe dez milhões mediante a sua assinatura. A dele faz parte das fortunas de segunda ordem de que lhe falava há pouco, meu caro Sr. Danglars.
— E, no entanto, como é simples! Tomá-lo-ia apenas por um major, se não soubesse mais nada a seu respeito.
— E já seria uma grande honra para ele! Porque o senhor tem razão, o homem não tem grande figura. Quando o vi pela primeira vez, pareceu-me um velho tenente que tivesse criado bolor debaixo da sua charlateira. Mas todos os italianos são assim: lembram velhos judeus, quando não deslumbram como magos do Oriente.
— O rapaz é melhor — declarou Danglars.
— Sim, mas talvez um bocadinho tímido. No entanto, pareceu-me aceitável. Estava preocupado, sabe?
— Por quê?
— Porque o senhor viu-o em minha casa pouco depois da sua entrada na sociedade, pelo menos segundo me disseram. Viajou com um preceptor severíssimo e nunca viera a Paris.
— Todos esses italianos de alta linhagem têm o hábito de casar entre si, não é verdade? — perguntou negligentemente Danglars — Gostam de juntar as suas fortunas.
— Habitualmente procedem assim, é verdade; mas Cavalcanti é um original que não faz nada como os outros. Ninguém me tira da idéia que mandou vir o filho para França a fim de ele arranjar mulher.
— Parece-lhe?
— Tenho certeza.
— Já ouviu falar da sua fortuna?
— Não se fala de outra coisa. Simplesmente, uns atribuem-lhe milhões, ao passo que outros pretendem que não possui centavo.
— E qual é a sua opinião?
— Não deve confiar demasiado nela; é meramente pessoal.
— Mas enfim...
— Na minha opinião, todos esses antigos podestades, todos esses velhos condottieri, porque os Cavalcanti comandaram exércitos e governaram províncias; na minha opinião, repito, eles enterraram milhões em recantos que só os seus primogênitos conhecem e dão a conhecer aos seus primogênitos de geração em geração. E a prova é que são todos amarelos e magros como os seus florins do tempo da República, de que conservam um reflexo à força de os olhar.
— Perfeito — concordou Danglars — E isso é tanto mais verdade quanto é certo ninguém conhecer uma polegada de terra a toda essa gente.
— Muito pouca, pelo menos. Pela minha parte, só conheço a Cavalcanti o seu palácio de Luca.
— Ah, ele tem um palácio! — exclamou, rindo, Danglars — Já é qualquer coisa.
— Pois é, embora o tenha alugado ao ministro das Finanças, enquanto ele mora numa casinha. Oh, mas como já lhe disse, creio que o homenzinho é um avarento!
— Então, então, não seja tão severo...
— Ouça, eu mal o conheço. Creio tê-lo visto três vezes na minha vida. O que sei a seu respeito é por intermédio do Abade Busoni e por ele mesmo. Falava-me esta manhã dos seus projetos acerca do filho e deixava-me entrever que, farto de ver dormir fundos consideráveis na Itália, que é um país morto, gostaria de encontrar maneira, quer na França, quer na Inglaterra, de fazer frutificar os seus milhões. Mas tome sempre bem nota que, embora tenha a maior confiança no Abade Busoni, pessoalmente não garanto nada.
— Não importa. Obrigado pelo cliente que me arranjou. Trata-se de um belíssimo nome a inscrever nos meus registros, e o meu tesoureiro, a quem expliquei quem eram os Cavalcanti, ficou todo orgulhoso. A propósito, e isto não passa de um simples pormenor sem importância, quando essa gente casa os filhos, dá-lhes dote?
— Meu Deus, é conforme! Conheci um príncipe italiano, rico como uma mina de ouro, um dos primeiros nomes da Toscana, que quando os filhos casavam a seu gosto lhes dava milhões, e quando casavam contra sua vontade se limitava a conceder-lhes uma mesada de trinta escudos por mês. Admitamos que Andréa casa de acordo com os desejos do pai; talvez este lhe dê um, dois ou três milhões. E se casasse com a filha de um banqueiro, por exemplo, talvez adquirisse uma quota na casa do sogro do filho... mas suponha também que a nora lhe desagradava: adeus, minhas encomendas, o pai Cavalcanti pegava na chave do cofre, dava-lhe duas voltas na fechadura e mestre Andréa ver-se-ia obrigado a viver como um filho-família parisiense, marcando cartas ou viciando dados.
— Esse rapaz encontrará uma princesa bávara ou peruana. Ambicionará uma coroa fechada, um Eldorado atravessado pelo Potosi.
— Não, todos os grandes senhores do outro lado dos montes casam freqüentemente com simples mortais. São como Júpiter, gostam de cruzar as raças. Mas diga-me, meu caro Sr. Danglars: é por pretender casar Andréa que me faz todas essas perguntas?...
— Confesso — respondeu Danglars — Que não me parece má especulação. E eu sou um especulador...
— Presumo que não seja com Mademoiselle Danglars... decerto não quereria ver o pobre Andréa degolado por Albert...
— Albert? — exclamou Danglars, encolhendo os ombros — Bem se preocuparia ele com isso!
— Mas, se me não engano, trata-se do noivo da sua filha...
— Bom, o Sr. de Morcerf e eu falamos algumas vezes desse casamento; mas a Sra. de Morcerf e Albert...
— Decerto não me vai dizer que não é um bom partido...
— Eh, eh, Mademoiselle Danglars vale bem o Sr. de Morcerf, parece-me!
— O dote de Mademoiselle Danglars será excelente, com efeito, não duvido disso, sobretudo se o telégrafo não fizer mais novas loucuras.
— Oh, não se trata apenas do dote? Mas diga-me uma coisa...
— O quê?
— Porque não convidou Morcerf e a família para o seu jantar?
— Também o convidei, mas ele objetou-me com uma viagem a Dieppe com a Sra. de Morcerf, a quem recomendaram o ar do mar.
— Sim, sim — disse Danglars rindo — Deve fazer-lhe bem...
— Porque diz isso?
— Porque foi o ar que ela respirou na juventude.
Monte Cristo deixou passar o epigrama sem parecer prestar-lhe atenção.
— Mas enfim — disse o Conde — Se Albert não é tão rico como Mademoiselle Danglars, o senhor não pode negar que possui um belo nome.
— De acordo, mas também gosto do meu — perguntou Danglars.
— Claro que o seu nome é popular e honrou o título com que se supôs honrá-lo, mas o senhor é um homem suficientemente inteligente para compreender que, de acordo com certos preconceitos excessivamente enraizados para que os extirpem, nobreza de cinco séculos vale mais do que nobreza de vinte anos.
— É exatamente por isso — respondeu Danglars com um sorriso que procurou tornar sardônico — É por isso que preferiria o Sr. Andréa Cavalcanti ao Sr. Albert de Morcerf.
— Mas eu supunha que os Morcerf não ficavam atrás dos Cavalcanti... — observou Monte Cristo.
— Os Morcerf!... Ouça, meu caro Conde — prosseguiu Danglars — O senhor é um homem de sociedade, não é verdade?
— Julgo que sim.
— E, além disso, perito em brasões?
— Um pouco.
— Pois então, veja a cor do meu; é mais firme do que a do brasão de Morcerf.
— Por quê?
— Porque eu, se não sou barão de nascimento, ao menos chamo-me Danglars.
— E depois?
— Ao passo que ele não se chama Morcerf.
— Como é que não se chama Morcerf!
— Nem por sombras.
— Mas por quê?!
— A mim, alguém me fez barão e, portanto o sou; ele fez-se conde sozinho e portanto não o é.
— Impossível.
— Escute, meu caro Conde — continuou Danglars — O Sr. de Morcerf é meu amigo, ou antes, meu conhecido, há trinta anos. Eu, como o senhor sabe, não ligo importância ao meu brasão, pois nunca esqueci de onde vim.
— Prova de uma grande humildade ou de um grande orgulho — comentou Monte Cristo.
— Pois bem, quando eu era praticante de escritório, Morcerf era simples pescador.
— E então chamava-se?...
— Fernand.
— Apenas?
— Fernand Mondego.
— Tem certeza disso?
— Ora essa! Vendeu-me peixe mais do que suficiente para que o conheça.
— Então porque lhes dava a sua filha?
— Porque Fernand e Danglars não passam de dois novos-ricos, ambos enobrecidos, ambos enriquecidos, que no fundo valem tanto um como outro, exceto no tocante a certas coisas que se disseram dele e que nunca se disseram de mim.
— O quê?
— Nada.
— Ah, sim, compreendo! O que me diz agora refresca-me a memória a propósito do nome de Fernand Mondego. Ouvi pronunciar esse nome na Grécia.
— A propósito do caso de Ali-Pax?
— Exatamente.
— É aí que reside o mistério — prosseguiu Danglars — E confesso que daria muito para o descobrir.
— Não é difícil, se tem muita vontade disso.
— Como?
— Sem dúvida tem algum correspondente na Grécia?...
— Claro!
— Em Janina?
— Tenho-os em toda a parte...
— Bom, escreva ao seu correspondente em Janina e pergunte-lhe que papel desempenhou na catástrofe de Ali-Tebelin um francês chamado Fernand.
— Tem razão! — exclamou Danglars, levantando-se vivamente — Escreverei hoje mesmo!
— Faça-o.
— Vou fazê-lo.
— E se receber alguma notícia muito escandalosa...
— O informarei.
— Me daria muito prazer.
Danglars correu para fora da sala e num salto alcançou a sua carruagem.





 continua...





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Primeira Lei de Murphy: "Se alguma coisa tem a mais remota chance de dar errado, certamente dará".
Comentário de Churchill sobre o homem: "O homem pode ocasionalmente tropeçar na verdade, mas na maioria das vezes ele se levanta e continua indo na mesma direção".

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